O primeiro dia um pai nunca esquece
As famílias começaram a contratar cinegrafistas profissionais para filmarem os partos quando perceberam que pai com câmera na mão, na hora em que o bebê está nascendo, quase nunca dá certo. As imagens estão perfeitas enquanto ele filma a chegada à maternidade, os preparativos no quarto, as primeiras contrações da mulher... Até aí tudo bem. O futuro papai está lá, felizão da vida, gravando tudo e ainda inventando uns efeitos especiais.
- Amor, olha pra cá e dá um sorrisinho.
A mulher, suada, cabelo grudado na testa e vermelha de tanto fazer força só pensa em acabar com aquilo o mais rápido possível. Mas, mesmo assim, ainda esboça um sorriso, que é para o filme do nascimento do primogênito ficar lindo.
Quando o médico diz: "Agora sim é pra valer. Faz força, mãe. Faz a maior força que puder. Já estou vendo a cabecinha do bebê...". Ah, pra quê. Nesta hora, o cinegrafista, que já se achava o próprio Tarantino, nem lembra mais que está com a máquina na mão. O enquadramento vai para o beleléu. Ele filma o teto, o chão, um pedaço do médico, as costas das enfermeiras. Tudo, menos a mãe e o bebê.
A emoção é tanta que a mão treme, o coração bate forte demais e não tem como segurar as lágrimas. Quando o pai volta do breve e profundo transe, o recém-nascido já está pendurado de cabeça pra baixo e chora forte, mostrando que chegou. Só aí ele lembra que esta cena é importante e pede para o médico repetir o tapinha na criança.
- É que perdi aquele momento. Só mais uma vez, por favor.
Médicos que trabalham em sala de parto já conhecem os papais - especialmente os de primeira viagem - e costumam ter paciência com eles. Não desmaiando nem tendo um ataque nervoso, já está bom tamanho. Mas existem casos assim, e aí a equipe tem de se desdobrar para atender a mulher, o bebê e o pai.
Já recomposto da emoção inicial, o cinegrafista acompanha, então, o trabalho das enfermeiras e a entrega do bebê, todo enroladinho, para uns minutos de conforto e reconhecimento no colo da mãe. Rende outras belas cenas para o filme. Depois, o pai pede para o médico gravar um pouco - afinal, ele também faz parte desta história. E costuma aparecer nas filmagens com cara de babão, já totalmente apaixonado por aquele serzinho, tão frágil, tão pequenininho, mas ao mesmo tempo capaz de preencher completamente o coração do casal.
Mais tarde, vem a hora de apresentar o novo membro à família, avós, tios, primos, padrinhos. A chegada em casa, o quartinho preparado com tanto carinho durante nove meses, a primeira papinha, o dia em que deu o primeiro passinho, o aniversário de um aninho...
O pai se torna um craque em fotografar e filmar o filhote. Algumas vezes vai até chorar de emoção ao fazer isso. Mas o nascimento, quando viu a carinha do bebê pela primeira vez, ah, esse momento ficará guardado para sempre. Tempo nenhum apaga.