A gente nota que está ficando velho quando - entre mil outras coisas - começa a recordar o passado com frequência, e a dizer, entre suspiros:
- Ah, tempo bom aquele!
Estou assim, numa fase de reminiscências e saudades. Mas não é tristeza. Pelo contrário. Eu me considero privilegiada por ter vivido bem, pelo menos até aqui.
Chego a rir sozinha quando recordo de algumas épocas. Década de 1970, por exemplo. Eu era pequena e um fato muito importante marcou minha infância: a chegada da televisão colorida! Foi o máximo!
Tínhamos, como a maioria das famílias, uma TV em preto e branco que mais parecia um móvel de tão grande. A caixa era de madeira, o seletor de canais ia do 0 ao 12 e, ao ser girado, fazia tac-tac-tac. Quando ligava o aparelho, demorava para aparecer a imagem, porque ele tinha que "esquentar" primeiro.
Eu adorava ver desenhos. Saía às pressas da aula quando "batia a sineta" (usando a linguagem da época) para chegar logo em casa e não perder a sessão de desenhos animados do fim da tarde, com um copo de Nescau bem geladinho numa mão e um pratinho de bolachas Maria na outra. Ô, delícia!
A televisão em cores era artigo de luxo, só para quem tinha muito dinheiro, o que não era o nosso caso. Lembro de quando uma colega chegou na escola contando que seu pai (um rico empresário) havia comprado uma TV colorida. Metade da sala foi à casa dela conhecer a última maravilha tecnológica. Eu não. Enquanto não visse, não ficaria louca para ter uma também. Melhor resistir à tentação.
Um dia cheguei em casa e - surpresa! - meu pai, sempre antenado com as novidades tecnológicas, havia comprado um artefato muito original, que talvez os leitores beirando os 50 anos ainda lembrem, porque se tornou uma "coqueluche" (outra palavrinha antiga, para combinar): era um plástico duro, listado, com várias cores (horizontais ou verticais), que se colocava na frente da tela da televisão. Assim, ela ficava automaticamente colorida! Quem será o gênio que teve essa ideia?
Era o máximo! Nunca mais vi desenho nem novela em preto e branco. O único problema, lembro bem, é que a metade do rosto do Tarcisio Meira (um gato, naquela época) ficava rosa, a outra azul. Ou amarela e verde. Ou roxa e vermelha. Os vestidos da Regina Duarte, o carro do Francisco Cuoco, a casa da Dina Sfat, tudo era multicolorido.
Até o mar, nas cenas da telenovela que mostravam as praias cariocas, era pincelado com as cores do arco-íris. Psicodelismo total, só que um pouco atrasado, na metade dos anos 1970. Mas nós, a classe média, enfim podíamos dizer que tínhamos televisão em cores em casa!
Nem sei o tempo que durou aquilo. Lembro da mãe lavando e tirando o pó do nosso plástico colorido, até que um dia, ao voltar da aula, entrei na sala e... lá estava a TV em cores. Que dia mais feliz! Fui dormir mais tarde - uma concessão, porque na minha casa criança ia para a cama às 21h30min, com exceção dos fins de semana - para poder curtir a novidade.
Nos dias seguintes, não cabia em mim de tão feliz. Tudo colorido e cada cor no seu lugar! Era uma TV só, na sala de casa. Todo mundo via junto, apertadinho no sofá.
Bons tempos aqueles.
Até o mar, nas cenas da telenovela, era pincelado com as cores do arco-íris
Viviane Bevilacqua
Enviar emailGZH faz parte do The Trust Project
- Mais sobre: