Nova York - Alguém se empolga na hora de comprar um sofá? Não posso dizer que a perspectiva desperte o consumidor apaixonado dentro de mim.
Eu já me excedi com cadeiras, camas e talheres escandinavos, mas nunca me vi tentado a gastar os tubos num sofá. Quando sou convidado a visitar a casa dos amigos, seus sofás não me provocam inveja.
Talvez seja uma questão de ponto de vista. Pegue os carros, por exemplo. Ponha um Porsche ao lado de um Kia e fica fácil identificar o design e a engenharia superiores do primeiro e compreender (de alguma forma) sua etiqueta inflacionada. Porém, mostre-me dois sofás, um do segmento popular do mercado e outro do sofisticado, e não consigo enxergar muita diferença entre o sofá de US$ 700 da Bob's Furniture Barn e o modelo B&B Italia que me custaria mais de US$ 10 mil. Ambos lembram mais ou menos caixotes acolchoados. À exceção de maus tratos ginásticos, ambos provavelmente ainda estarão em pé daqui a 20 anos.
Durante anos, eu inspecionei minha sala de estar instalado numa cópia barata dinamarquesa moderna, longa e baixa feito um barco, pela qual paguei US$ 100 numa loja de móveis usados. Quando uma das pernas quebrou, enfiei livros embaixo e passei a preferir o lado bom. Pareceu-me uma solução prática. Os sofás sofrem muitos abusos (os meus, pelo menos): absorver comprimidos, coletar pelo animal, servir de cama para amigos desgarrados. Na frota da mobília da sala de estar, eles são os veículos da família. Por que pagar uma fortuna num Caravan?
Há quem afirme que uma ótima peça para sentar dura uma vida, mas quem quer se casar com um sofá? Ele será passado às gerações futuras? Nunca se escuta crianças brigando pelo divã.
E mesmo assim, agora que preciso de um sofá novo para substituir o antigo, eu tipicamente compro algo barato com tratamento deficiente, mas me sinto tentado a repensar minha abordagem. Afinal, pode valer a pena descobrir o que acontece no segmento sofisticado do design e da construção em oposição a um modelo econômico, e se vale a pena investir o dinheiro.
Aparentemente, pensar nos sofás como intercambiáveis é teimosia. Magnus Breitling, diretor de gestão de produto da fabricante de poltronas Emeco e ex-funcionário da Vitra, empresa moveleira suíça, acabou com os mal-entendidos em termos de sofás luxuosos.
- Existe muita inteligência investida no produto, não apenas na construção, mas na gestão de fornecedores. O esforço é muito mais elevado do que com o sofá típico da Macy's ou da Ikea - ele explicou.
Porém, o mesmo se dá com o preço. Um motivo para fabricantes como Ligne Roset e Vitra cobrarem significativamente mais é o envolvimento de um designer de ponta, assegurou Breitling. - Você investe tempo e dinheiro para jogar pingue-pongue com o designer porque ele tem uma visão.
Será que quero mesmo gastar US$ 5 mil a mais para subscrever o processo criativo de alguma pessoa? Posso ser vítima de estilistas de roupas, mas não de sofás.
Para mim, um argumento mais convincente teria a ver com uma construção superior. Como muitos homens, sou suscetível à ideia de coisas feitas por artesãos empregando ferramentas misteriosas e práticas envolvendo muito trabalho. Kayel De Angelis, da tapeçaria nova-iorquina De Angelis, aberta há mais de 60 anos pelo seu avô, Guido, é um desses artesãos. Para provar, ele começou a utilizar termos ligados à marcenaria que eu não compreendia, como malhete e espiga.
Segundo De Angelis, num sofá barato, "dá para ver as armações de compensado grampeadas, com espuma de borracha por dentro. Armações feitas assim podem durar um ano ou um pouquinho mais, e o braço pode se soltar".
Ainda de acordo com ele, a armação de um sofá personalizado ou chique de um fabricante como a Baker costuma ser de madeira resistente, como freixo ou bordo, unidas com cola e tarugo ou juntas macho e fêmea.
- A junta é tão forte quanto a madeira em si, ou até mais. E, além disso, as várias camadas de tapeçaria não estragam como acontece com a espuma de borracha.
Breitling também apontou as almofadas e a camada superior como outro diferencial.
- A vida útil do tecido ou couro é muito mais longa num sofá caro. A espuma termina afundando e solta. E com o tempo, a espuma se desgasta.
Porém, supondo que eu esteja disposto a investir num sofá bem-feito de verdade, como vou saber se receberei algo à altura dos US$ 10 mil - ou se estou pagando US$ 2 mil pelos materiais e fabricação e US$ 8 mil pelo marketing e o design europeu bacana?
Annie Elliott, decoradora de Washington que tem opiniões fortes sobre o tema, acredita que um sofá de cinco dígitos não se resume à badalação.
- Ao contrário da moda, quando se paga pelo estilo e nome, mas não necessariamente pela fabricação, no caso de um sofá creio que estamos pagando pela qualidade. Você recebe coisas como plumas e almofadas em vez de espuma.
Ainda segundo Elliott, ainda é possível comprar um sofá muito bom, com armação de madeira sólida e almofadas de espuma cheias de plumas por até mesmo US$ 1,5 mil se encontrar uma pechincha. E ela não vê muita diferença em sofás com preço intermediário, digamos entre US$ 2 mil e US$ 4 mil.
- Contudo, quando você fica abaixo dos US$ 1 mil, é preciso começar a tomar cuidado - pois os fabricantes provavelmente simplificam o processo para manter o preço baixo.
Embora Elliott compreenda o valor de investir num sofá refinado, ela acredita que a compra depende do seu estágio na vida.
- Se você está naquele período nômade, mudando-se em intervalos de poucos anos, às vezes sem empresas de mudança, é melhor não investir num sofá caro. Ele vai virar lixo.
E se você for um solteiro instalado num apartamento, mas não quer comprar um sofá caro que a futura esposa possa vir a odiar? Elliott fez pouco caso dessa noção.
- É deprimente comprar tudo quase descartável e esperar que alguém o salve da mediocridade - ela afirmou.
Por favor, vamos nos ater à conversa sobre móveis.
Em nossa conversa anterior, Breitling citou a Poltrona Frau como empresa que faz sofás requintados que duram décadas, qualificando o couro de "simplesmente incrível". Eu visitei um showroom e curti um com pernas metálicas e uma forma elegante e simples, com preço de US$ 13 mil.
- Esse é o John-John - contou o vendedor, explicando ter sido projetado por Jean-Marie Massaud e batizado em homenagem a John F. Kennedy Jr. O nome não me empolgou e a designer não significava nada para mim, mas agucei os ouvidos quando o vendedor afirmou que, a exemplo de todos os sofás da Poltrona Frau, ele era "feito à mão, por homens trabalhando com ferramentas simples".
Eu desejava me inteirar mais. Telefonei para Roberto Archetti, diretor de marca da empresa na Itália, e perguntei ceticamente o que é usado num sofá de US$ 13 mil. Tijolos de ouro?
Com calma, Archetti começou a me esmurrar com as características luxuosas do sofá: o assento é feito de faia sólida, as plumas das almofadas são colocadas à mão, o couro de altíssima qualidade é tingido por inteiro, assim um arranhão não revelará o forro branco. E para obter o "conforto máximo", explicou Archetti, o John-John passou por vários protótipos.
Fui desarmado, mas ainda não tinha certeza de um sofá valer esse tipo de investimento. Eu não ficaria com medo de sentar nele?
Após minha conversa com Breitling, fiquei mais convencido, talvez pelo fato de ele ter se expressado recorrendo a termos automotivos com os quais eu podia me identificar. O Kia pode ser mais barato, ele ressaltou, mas daqui a 20 ou 30 anos o Porsche é o automóvel que ainda chamará atenção na rua.
Criticando nossa cultura descartável, Breitling acrescentou: - Dizem que somente os ricos podem se dar ao luxo de comprar coisas baratas.
The New York Times
Escolhendo o sofá certo pelo preço justo
Quais são as vatagens e as desvantagens de pagar caro por um divã mais sofisticado
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