Será que vamos, enfim, tornar mais natural aquela situação em que, ao chegar um amigo ou um parente, diremos, simplesmente: “Senta aí, toma um vinho”? E não, como é mais comum, toma uma cerveja, um suco, um cafezinho? Será que deixaremos que o vinho seja mais cotidiano e menos assustador para os brasileiros?
Já pude me manifestar neste espaço sobre como eu gostaria de ver espumantes, tintos e brancos mais presentes nos balcões, nos botecos. Sorvidos com a descontração com que portugueses, espanhóis e italianos os consomem nas tascas e enotecas. O que não conflita com o serviço mais formal nos restaurantes gastronômicos, com grandes rótulos, taças e gestos mais refinados – pois para tudo existe um momento adequado.
Sabemos que o preço ainda pesa para o consumidor (e que o produtor e/ou importador arcam com impostos e burocracias pesadíssimos). Sabemos que, diferentemente da Europa, onde o vinho é item alimentício, aqui ele é tratado pela legislação como quase um supérfluo. Mas sabemos também que, para além do bolso, existe uma questão cultural. Não só de costume, de familiaridade. Eu me refiro principalmente ao fato de a bebida ter sido posicionada como algo elitizado, ritualizado.
Contudo, depois de tantos anos de trabalho (de vinhateiros, comerciantes, formadores de opinião, sommeliers etc), de amadurecimento do mercado, sentimos que o ponteiro começa a se mover. Tanto no acesso como no impulso de buscar produtos que caibam no orçamento do público. E, principalmente, na abertura de estabelecimentos dispostos a popularizar o vinho, oferecendo-o em taças, em várias faixas de preço, tratando-o com respeito, mas simplicidade. Porque a freguesia só vai apurar o gosto provando. E só vai provar se perder medos de cometer gafes, de não poder pagar.
O consumo no país, que há anos se mantém em torno de dois litros por pessoa/ano, pode, desta vez, superar a média. E com uma perspectiva de conquistar a preferência dos jovens – em quem os profissionais do meio vêm prestando cada vez mais atenção. Quem sabe eu volte ao tema no ano que vem, celebrando então novos hábitos e números? Feliz 2019.
*Luiz Américo Camargo é crítico gastronômico e autor do livro Pão Nosso
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Mais vinho, por favor! | Luiz Américo Camargo
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