O francês Christian Voiriot trabalha há mais de 50 anos na área de patisserie e preside o Sindicato dos Padeiros e Confeiteiros da Grande Paris. Com um sorriso no rosto, semblante diferente do tipicamente e regrado código de conduta seguido pelos chefes europeus, ele visitou a Casa Destemperados para conhecer o espaço e conversar conosco sobre sua carreira e o mundo da gastronomia. Voiriot é um dos membros da ECTI – Professionnels Seniors, formada por empreendedores de diferenes áreas que dão aulas sobre seu campo de expertise. Em parceria deste instituição com o Senac do Rio Grando do Sul, o maître artisan vai ministrar cursos sobre confeitaria fina internacional durante os meses de setembro e outubro.
1. A gastronomia é um elemento muito forte da cultura francesa. Como ela entrou na vida do senhor?
Eu gosto de comer, é um bom início! A culinária é uma paixão pessoal também fora do trabalho. O meu lazer é cozinhar e eu tento cozinhar pratos de todos os mundos. Eu sou da terceira geração de uma família de padeiros e confeiteiros, então eu sempre tive isso muito forte e presente na minha vida. E o meu filho continua essa herança.
2. Quais foram as principais dificuldades para começar na profissão?
Eu não tive dificuldades porque sempre tive muita curiosidade e apoio da minha família. Eu não precisei sair de casa para tentar a vida, eu tive a sorte de poder terminar minha semana de trabalho e voltar para a casa dos meus pais, o que é sempre ótimo. Além disso, eu frequentava locais que me permitiam desenvolver minha capacidade criativa e criar bolos.
3. E da confeitaria em geral, quais os principais desafios?
Eles dizem sobretudo à dimensão artística, porque a confeitaria, contrariamente à culinária que pode ser instantânea, é muito programada e deve ter um equilíbrio exato de todos os ingredientes. Isso é em relação ao gosto. A parte visual tem a ver com criatividade, imaginação, e conhecimento de mundo para poder realizar coisas inovadoras.
4. Como o senhor apresentaria seu trabalho a quem não conhece os seus doces?
É sempre muito difícil falar de si mesmo. Eu acredito que o eu faço, sempre faço com amor e paixão, porque a cozinha e a confeitaria são uma forma de compartilhar e viver bons momentos ao lados dos amigos. Tudo no mundo me inspira. É apaixonante poder fazer comparações entre diferentes culturas, porque mesmo que às vezes elas sejam muitos diferentes, há similaridades quando falamos em gastronomia. Por exemplo, os japoneses e alemães, que são de países em que já morei, têm pratos em comum. Todos as viagens que foram feitas por mim e pelos outro no passado me influenciam, desde as colonizações, que sempre foram felizes, mas permitiram a transmissão de valores culinários. Talvez essa seja o único ou o maior ponto positivo delas.
5. Esta é a primeira vez do senhor no Rio Grande do Sul. Como surgiu a oportunidade de vir para cá?
Eu já estive em Brasília para a primeira edição deste curso, então está é a segunda parte da missão. Eu faço parte de uma associação francesa chamada ECTI – Professionnels Seniors, uma entidade que presta assessoria e assistência a empresas na França e no exterior e ajuda estudantes no início de sua vida profissional. É uma instituição de empreendedores aposentados que se dedica a compartilhar conhecimento. Em parceria com o SENAC, eu vim ao Brasil para falar sobre a confeitaria francesa.
6. Quais serão as temáticas abordadas no curso aqui no Rio Grande do Sul?
São cursos em diferentes cidades nos quais vou realizar oficinas práticas de massas, recheios, coberturas e decorações, além de pratos da confeitaria francesa, como o entremet e o macaron. Vou responder às demandas que forem surgindo e às perguntas de quem quiser saber mais sobre o patrimônio culinário da França.
7. O senhor trabalha na área há mais de 50 anos. Desde lá, muita coisa mudou no mundo. Como foi se adaptar a essas mudanças?
Eu sempre tive vontade de descobrir e saber mais para ajudar nas minhas criações. A evolução do meu trabalho se deu muito com as mudanças dos hábitos alimentares e culturais das pessoas ao longo dos anos. Foi algo natural. Os bolos que eu fazia há 50 anos ainda existem, mas foram adaptados aos gostos atuais.
8. Quando falamos de culinária francesa, existem pratos e doces marcantes. Nessa sua estada no Brasil, como o senhor percebeu a relação da gastronomia com o aspecto cultural do país?
Eu não conheço muito o nível da gastronomia brasileira e como ela é percebida enquanto elemento cultural, mas quando estive em Brasília, fiquei surpreso em constatar que faltava uma identidade na culinária por lá. O que eu percebi é que existem muitas adaptações e releituras da cozinha mundial, italiana, alemã, asiática e até mesmo francesa. Eu não achei muitos produtos originais da região. Por outro lado, percebi que Porto Alegre tem algumas especificidades muito mais fortes. Não posso citar apenas um prato, mas vi muitos aromas com os quais eu não estava habituado.
9. Atualmente, o senhor é presidente do Sindicato dos Padeiros e Confeiteiros da Grande Paris. Qual a atribuição deste órgão?
O Sindicato foi criado em 1801 sob ordem de Napoleão. Ele quis assegurar a estabilidade e sobretudo a revitalização da população francesa em relação ao pão, além de funcionalizar os padeiros. Na época, Paris tinha muitas casas de madeira e havia muitos incêndios. Por conta disso, os padeiros não tinham locais para trabalhar, então eles iam aos fornos comuns que existiam no sindicato. A função evoluiu para a defesa do nosso trabalho e a salvaguarda dos trabalhos feito em Paris em relação à concorrência. É nosso papel também garantir a promoção do nosso trabalho através de várias manifestações, como a festa do pão, que ocorre diante de Notre Dame e tem uma tenda de 2.500 m² que acolhe cerca de 25 mil pessoas por dia. Nestas ocasiões, recebemos todos os anos uma delegação estrangeira que fabrica especialidades nacionais e eu espero que o Brasil possa fazer parte.
10. Inspirando-se na gastronomia francesa chegou ao nível de símbolo cultural, o que o Brasil pode desenvolver para desenvolver sua identidade culinária?
Eu acredito que nós perdemos no último mês um grande cozinheiro, Joël Robuchon, que foi diretor fundador de um importante império mundial de restaurantes gourmet e um dos pioneiros da Nouvelle Cuisine. Ele sintetizava as bases da nossa gastronomia: era muito exigente e trouxe coisas muitos nobres para a cozinha, porque aplicava sua arte com muito rigor. É por isso que muitos franceses progrediram, se inspirando nesse homem em particular, porque existem outros. Dessa mesma forma, é por isso que nos inspiramos no Brasil para jogar futebol, porque quando alguém domina qualquer coisa, é uma referência. Vocês têm tantas estrelas na camisa da seleção quanto nós temos nos restaurantes. Eu acredito também que precisar fazer as coisas com amor. É dessa maneira que conseguimos ter sucesso.
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10 perguntas para o mestre-confeiteiro francês Christian Voiriot
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