Se você é daqueles que se surpreendeu com os quatro Emmy concedidos a The Marvelous Mrs. Maisel, série do serviço de streaming Prime Video, na noite desta segunda-feira (17), fique sabendo que ela já é uma das queridinhas do público. Produzida pela plataforma da Amazon e criada por Amy Sherman-Palladino, a mesma do sucesso Gilmore Girls, a trama já havia conquistado dois Globo de Ouro no início do ano - melhor série de comédia e melhor atriz (Rachel Brosnahan). Agora, repetiu o feito no Emmy e ainda incluiu mais dois troféus: melhor atriz coadjuvante (Alex Borstein), roteiro e direção.
The Marvelous Mrs. Maisel estreou no final de novembro do ano passado. O sucesso foi tanto que a Amazon já a renovou para mais duas temporadas - a segunda deve estrear ainda em 2018.
É estrelada por Rachel Brosnahan, que interpreta Midge Maisel, a heroína determinada da trama, ambientada na Manhattan de 1958. Descarada, visceral e explicitamente dada a confissões, Midge é uma dona de casa dedicada e comediante por acaso.
No episódio piloto (disponível no YouTube, apenas em inglês), a vida confortável da protagonista no Upper West Side entra em colapso: molhada até os ossos de chuva e bêbada de tristeza (e vinho kosher), ela se vê no palco do Gaslight Cafe, um clube meio deprimente do Greenwich Village. E rouba o microfone.
Nos poucos minutos seguintes, despeja uma mistura de histórias cáusticas e comentários mordazes, o que lhe rende aplausos entusiasmados e uma detenção por atentado ao pudor. Precursora que a comédia moderna deveria ter tido, Midge é a ancestral de engenharia reversa de Ali Wong ou Tig Notaro.
Pitadas de Lorelai Gilmore
Como nas outras atrações de Amy Sherman-Palladino, The Marvelous Mrs. Maisel gira em torno de uma mulher que sobrevive a um cataclismo doméstico. Lorelai Gilmore (Lauren Graham), debutante com planos de estudar em Harvard, tem uma filha aos 16 anos e deixa a família de classe alta para encarar um emprego nada glamouroso em uma pousada; Michelle Simms (Sutton Foster), a protagonista de Bunheads, passa de dançarina em Las Vegas a viúva em uma cidadezinha praiana; Midge Maisel larga as travessas para pegar o microfone.
Como Lorelai e Michelle, Midge se vê "vivendo uma vida completamente diferente, em que nunca tinha pensado ou sequer imaginado", explica Amy.
Em comparação com os seriados anteriores, a tal vida é representada muito mais artisticamente: Midge tem um guarda-roupa de época matador, em tons de verde-azulado e rosa; a Nova York dos anos 1950/60 também garante o espetáculo. Os personagens são os judeus do Upper West Side, em contraste gritante com os WASPs de Connecticut de Gilmore Girls, embora Amy diga que "Lorelai e Rory são as personagens mais WASPs e judias que já criei" (Lembra o "Oy with the poodles"?).
Amy, que quando adolescente vendeu cigarros no Comedy Store, o famoso clube de Los Angeles, assumiu a tarefa de escrever todas as piadas do stand-up de Midge sem se dar ao trabalho de pesquisar o papel das mulheres na comédia do fim dos anos 1950. (Não há muito que pesquisar.) Porém, foi buscar inspiração em Totie Fields, que era meio arroz de festa no The Mike Douglas Show, e em Joan Rivers, que fazia comentários do tipo "Nenhum homem põe a mão no decote de uma mulher para procurar o cartão da biblioteca".
- O que não deixa de ser uma piada atrevida, e uma das melhores da época - afirma Amy.
Na busca por alguém que pudesse contar as piadas de Midge, ela convocou várias estrelas cômicas para testes, mas optou por Brosnahan, atriz dramática que interpretou uma prostituta durona em House of Cards, a esposa insatisfeita de um médico em Manhattan e uma Desdêmona compassiva ao lado de Daniel Craig na versão off-Broadway de Otelo. Durante o teste, a moça acertou na mosca a interpretação da cena do stand-up, intuindo que a comédia de Midge era fruto de sua confusão e angústia.
- Com um toque de quase raiva - relembra Amy, que acrescenta: - É o que fazem todos os comediantes desse ramo.
Rachel confessa que não se considera comediante; nunca nem se arriscou no stand-up, a não ser nas filmagens, e nem pretende.
- Só a ideia de encarar um microfone aberto me dá ânsia - exagera.
Para encarnar Midge, Rachel consultou uma pilha de exemplares antigos de Good Housekeeping, separando os artigos sobre o comportamento das esposas da época, além de estudar o roteiro da comediante pioneira Jean Carroll.
- Era uma mulher bonita, muito graciosa, que usava colares de pérolas e vestidos lindos, além de cantar um pouco - descreve.
Nas filmagens do piloto, a atriz se sentiu "horrível, praticamente dura" ao encarar a sequência do stand-up. Depois de gravar mais sete episódios, ela continuava "petrificada, mas de uma maneira muito gratificante, sabe como é?".
O que mais vale a pena?
A própria Midge, que Amy descreve como "pura energia e luz, dona de uma força incrível", o que faz com que se pareça muito com as outras mulheres da autora, faladoras e fortes. Entretanto, há uma diferença fundamental.
- Midge encontrou um público muito maior com que interagir - conclui Amy, orgulhosa.
Como ver
The Marvelous Mrs. Maisel tem apenas uma temporada, com oito episódios (cerca de 1 hora cada). Está disponível para assinantes da Amazon Prime Video (a assinatura mensal custa R$ 14,90)