A participação do Brasil na Feira do Livro de Frankfurt, que segue até domingo, não se resume à produção literária. Música, artes plásticas, teatro, street art, arquitetura, várias formas expressivas foram convocadas para representar o país. Ao contrário do que costuma acontecer, no entanto, o Brasil chegou à Alemanha de uma maneira bastante crua, apartada das idealizações exóticas que costumam marcar a representação do país em qualquer parte do mundo.
No segundo dia da Feira, última quarta, estreou a primeira parte de Puzzle, espetáculo concebido e dirigido por Felipe Hirsch e que envolve uma série de esquetes baseados em textos de autores brasileiros, criados especialmente para a Feira do Livro de Frankfurt. Com cenários de Daniela Thomas, trilha sonora original criada por Arthur de Faria e pinturas executadas ao vivo por Rafael Coutinho (também quadrinista, como o pai, Laerte), a estreia levou um bom público ao Mousonturm, um pequeno centro cultural na área central da cidade.
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A ideia de quebra-cabeças do título se concretizou no palco com uma série de esquetes, narrativas fragmentadas tão em voga e que, se por um lado flertam com o nonsense, por outro conseguem materializar grande parte dos absurdos que nosso país é capaz de gerar. Desde o jogo de sedução entre um casal ao depoimento de um policial que representa o máximo de sadismo imaginável (ou não), Puzzle mostra na Alemanha um Brasil tão de verdade que chega a ser constrangedor: sem concessão alguma e com possibilidade zero de ufanismo.
Destaque ao elenco formado por Felipe Rocha, Georgette Fadel, Isabel Teixeira, Luna Martinelli, Magali Biff, Marat Descartes e Rodrigo Bolzan. Na mesma linha de desnudar o rei e de falar de uma forma realista do país, continuaram intensas as discussões acerca do discurso de abertura do escritor Luiz Ruffato que, literalmente, desancou qualquer romantismo que ainda houvesse relativo à realidade brasileira. Se, da plateia, Ziraldo (que passou mal na quinta e foi hospitalizado) levantou e sugeriu que Ruffato se mudasse do Brasil e de suas mazelas, se o vice-presidente Michel Temer tratou de falar de um país de promissão, grande parte da comitiva brasileira de escritores tende a concordar com Ruffato. Autores, editores, agentes literários brasileiros, todos parecem ter trazido a Frankfurt o travo amargo dos desmandos e dos últimos acontecimentos.