Num congresso de bioética realizado há alguns anos em Brasília, em que depois levaram Peter Singer, vegetariano convicto (cujas ideias inspiraram o filme australiano Babe, o Porquinho Atrapalhado), a comer na churrascaria Porcão, vimos como ele aceitava de modo singelo ser fotografado junto a seus leitores de nosso continente. Minha filha bióloga, interessada em bioética, quis fotografar-nos também. Como pretexto, perguntei ao filósofo australiano se sua proposta, de que 10% do que possuímos deveria, por uma obrigação moral, ser doado a pessoas que estejam em condições econômicas mais precárias, seria mesmo de 10%, ao pé da letra. Pergunta simples e objetiva, que podia ser respondida no claro idioma alemão, que ali utilizamos. Como eu esperava, replicou que podia ser também nove ou onze por cento, pois o importante não era o número, mas o sentido de obrigação. Confirmei assim, de viva voz ou em primeira mão, uma tese tão simples quanto prenhe de consequências: se todos, ricos ou pobres, dedicassem a décima parte de suas posses aos mais necessitados, todo mundo viveria muito melhor, ninguém ficando realmente pior, pois todos manteriam seus 90%.
Nós e os outros
Peter Singer discute a consciência do dever moral de cada um para com o outro
O professor Alvaro Valls traz uma reflexão sobre a matemática do altruísmo do filósofo australiano