Ator, diretor e pesquisador teatral, Matteo Bonfitto participará do festival como diretor e um dos atores de Cry, Baby, Cry! - Um Tríptico Cênico, do grupo Performa (SP). No dia 13 de abril, ele realizará uma conferência.
> Festival de Teatro de Rua de Porto Alegre volta os olhos para o Exterior
Zero Hora - A rua mantém um caráter revolucionário ao democratizar o acesso às artes cênicas?
Matteo Bonfitto - Essa é uma questão complicada. Muitas vezes, o teatro de rua foi utilizado politicamente para tentar ser visto quase como uma ação filantrópica com as pessoas que não têm dinheiro para ir ao teatro. Para mim, essa questão das manifestações cênicas de rua vão muito além disso. Não é uma ação filantrópica. Quando você vai para a rua, está lidando com uma situação completamente diferente do teatro (de palco), em que as pessoas compram um ingresso, estão lá por escolha própria e têm uma expectativa específica. Na rua, o artista lida com uma situação imprevista, na qual ele tem muito menos controle sobre o que vai acontecer. Principalmente na performance e na intervenção urbana, a atuação é muito determinada pelas dinâmicas que acontecem ali naquele momento. Ao se colocar nesse lugar, o artista se propõe politicamente de outro jeito, em que deixa de ser o centro da ação e passa a ser um dispositivo, um viabilizador de processos em que o espectador passa a ser um participante.
ZH - O público das classes média e alta se refugia nos cinemas e teatros de shoppings. Como o teatro de rua deve conquistar um público que tem medo, cada vez mais, do espaço público?
Bonfitto - Quando falamos do teatro feito nesses bunkers, nesses lugares protegidos, muitas vezes estamos falando de um teatro que se propõe como entretenimento. Acho que a questão das manifestações cênicas de rua, de uma certa forma, têm a ver com um resgate do que o teatro já foi um dia. Quem conhece a história do teatro e das artes cênicas sabe o poder de ressonância que essa forma de arte teve historicamente. Dependendo da forma como essas manifestações são propostas, podem fazer com que mesmo esse público de classe média comece a reconhecer que ali há a possibilidade de viver um outro tipo de experiência.
ZH - Podemos ser otimistas nesse sentido?
Bonfitto - Talvez seja uma opinião um pouco otimista. Essas transformações são lentas e dependem de uma continuidade. Isso tem a ver com política cultural _ o quanto essas políticas vão possibilitar a continuidade de ações como o Festival de Teatro de Rua, que podem fazer com que essa atitude se tranforme, e as pessoas comecem a perceber que a rua não é só sinônimo de perigo. Na rua, você pode ter acesso a determinadas experiências que não tem dentro de um espaço fechado.
ZH - É possível identificar uma tendência que unifique os grupos que tuam hoje no país?
Bonfitto - Vivemos uma situação de diversidade, mas percebo que essa diversidade é maior fora do Brasil. No país, quando se pensa em teatro de rua, se pensa muitas vezes em um espetáculo que poderia ser apresentado em qualquer teatro. Ao mesmo tempo, acho que está acontecendo, há um tempo, uma percepção em que você não lida mais com algo que é deslocado do palco para a rua. Estar na rua significa atuar de outro jeito, porque você está inserido em um espaço imprevisível, em que as dinâmicas relacionais são, muitas vezes, incontroláveis. Estamos em um momento em que vemos, ao mesmo tempo, uma ideia de teatro de rua ainda convencional e grupos de artistas que estão desenvolvendo outros tipos de trabalho e manifestam essa percepção de que a rua é um lugar específico.
Artes cênicas
Entrevista: "Vivemos uma situação de diversidade", diz Matteo Bonfitto
O ator, diretor e pesquisador teatral realizará uma conferência no dia 13 de abril
Fábio Prikladnicki
Enviar emailGZH faz parte do The Trust Project
- Mais sobre: