Há uma velha máxima - nem tão velha assim - de que o teatro é uma linguagem artesanal na era da cultura de massa. Mas é difícil entender o que isso quer dizer até assistir a espetáculos como os da companhia Caixa do Elefante. Seja em uma produção intimista como Encantadores de Histórias, seja em uma mais escrachada, como Histórias da Carrocinha, há sempre a impressão de que as cenas não são ensaiadas, mas cinzeladas.
Não é diferente com A Tecelã, peça voltada para o público adulto que chega a seu último fim de semana no Teatro de Câmara Túlio Piva, na Capital, como parte das comemorações dos 20 anos da companhia (Histórias da Carrocinha fica em cartaz até 24 de abril).
Com direção de Paulo Balardim, A Tecelã é um trabalho cuidadoso que combina diversas linguagens: em uma performance de dupla dificuldade, Carolina Garcia interpreta a personagem-título e contracena com um boneco manipulado por ela mesma - por vezes com a parceria de Valquíria Cardoso e Viviana Schames. Aqui e ali a encenação é pontuada por técnicas de ilusionismo e projeções em vídeo, criando um espetáculo no qual o arcaico e o moderno se unem em um conjunto orgânico, de rara sensibilidade.
Logo na cena de abertura, Carolina brinca com um novelo, lembrando a mais antiga metáfora sobre a arte da narração, que remete à etimologia latina de texto como tessitura. Seu novelo, no entanto, parece mágico: move-se de modo inusitado, para no ar, desafia as leis da física. Essa estrutura de perda e recompensa é recorrente no espetáculo, lembrando a conhecida passagem de Além do Princípio de Prazer, em que Freud descreve o prazer da brincadeira de uma criança ao lançar um carretel, fazendo-o sumir e logo o puxando de volta. De modo parecido, é ao mesmo tempo bonito e angustiante ver a tecelã contracenando com um homem criado por sua própria imaginação - a história é baseada em um conto de Marina Colasanti. Alegoria perfeita da ficção teatral, o boneco provoca efeito semelhante no público, que tem sua percepção dividida entre a óbvia constatação de que se trata de um objeto inanimado e a irresistível vontade de acreditar no contrário.
Contribuindo para o clima onírico que dá cor ao espetáculo, não há falas. De vez em quando, ouvem-se suspiros, risos, sussurros. O andamento é conduzido pela bela trilha sonora original de Nico Nicolaiewsky, que também assina a direção musical.
A TECELÃ
Direção de Paulo Balardim.
Com Carolina Garcia, Valquíria Cardoso e Viviana Schames.
Hoje, às 21h, e amanhã, às 20h. Duração: 50 minutos. Classificação: 12 anos.
Teatro de Câmara Túlio Piva (República, 575), fone (51) 3289-8093.
Ingressos: R$ 25. Desconto de 20% para titular e acompanhante do Clube do Assinante.
Notícia
"A Tecelã" encerra temporada, combinando técnicas antigas e modernas
Peça está em cartaz no Teatro de Câmara Túlio Piva
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