Não deu para Ainda Estou Aqui no Globo de Ouro 2025. Pelo menos, não na categoria de filme em língua não-inglesa. A produção dirigida por Walter Salles, baseada no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, perdeu para o francês Emilia Pérez. Mas será que tal resultado vai se repetir no Oscar?
Bem, a primeira barreira que o longa-metragem tinha que romper foi a de aparecer na shortlist do Oscar de melhor filme internacional. E ele está lá, entre os 15 “semifinalistas”. Agora, resta esperar para que ele figure entre os indicados, que seleciona os cinco que vão para a disputa final da estatueta. As chances de indicação são grandes.
— Os filmes do Brasil sempre têm dificuldade com a distribuição, especialmente nos Estados Unidos. Ainda Estou Aqui tem uma distribuidora consolidada, e não é pequena (Sony Classics) — explicou, em entrevista recente para Zero Hora, Waldemar Dalenogare, que integra o Critics Choice Association e é autor do livro Histórias do Oscar: Os Anos Iniciais (2019).
Ter este apoio coloca o longa-metragem em uma posição privilegiada, visto que a maioria dos títulos nacionais não conseguem esta projeção internacional. E, claro, ter um diretor influente mundialmente como Walter Salles, com uma grande rede de contatos, ajudou neste processo.
A indicação, então, principalmente após a aclamação de Fernanda Torres no Globo de Ouro, deve, sim, ajudar a dar propulsão na campanha do filme, aumentando as suas chances de ser indicado. O motivo? A consagração da brasileira como melhor atriz de drama, derrotando nomes de peso de Hollywood, como Nicole Kidman e Angelina Jolie, poderá, pelo menos, despertar a curiosidade dos votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, responsável pelo Oscar, para assistirem à produção.
— A votação do Oscar começa no dia 8. No dia 7, a gente vai ter o último evento de campanha de Ainda Estou Aqui, em Los Angeles. Vai estar o Walter, vai estar a Fernanda, vai ter uma sessão de perguntas e respostas. Então, todo o momentum, essa construção, hoje, é de Ainda Estou Aqui em alta — salienta Dalenogare.
Crítico de cinema e editor da revista digital Almanaque21, Rodrigo de Oliveira também acredita que a produção de Walter Salles, agora, com toda a projeção conquistada no Globo de Ouro, teve as suas chances de indicação ao Oscar aumentadas. E ainda reforça a ideia de que a curiosidade entre os votantes vai ser despertada — ganhando tração pela enxurrada de matérias que saíram sobre Fernanda Torres em terras estadunidenses.
— A gente sabe que o filme brasileiro não é tão popular quanto outros filmes. O próprio Emilia Pérez é um filme da Netflix, então tem uma penetração diferente de um filme brasileiro, embora seja, claro, distribuído pela Sony Classics. Mas eu acredito que, agora, com a Fernanda Torres ganhando o prêmio, mais gente vai ver o filme e, com isso, mais chances ele tem de ser indicado — afirma Oliveira, salientando, porém, que os votantes do Globo de Ouro não são os mesmos do Oscar.
E ganhar?
É quase consenso que Ainda Estou Aqui deve, sim, aparecer entre os cinco indicados a filme internacional do Oscar. Mas e ganhar? Bom, aí já é outra história. Emilia Pérez tem uma campanha multimilionária por trás, com a Netflix investindo pesado para conquistar o seu primeiro careca dourado na categoria, inclusive, de melhor filme.
Porém, o filme francês vem acumulando reclamações por parte do público mexicano — visto que a produção retrata a cultura do país latino — e as acusações de explorar estereótipos podem pesar na escolha dos votantes, cada vez mais internacionais.
O diretor e roteirista Jorge Furtado, que trabalhou nada menos que 15 vezes com Fernanda Torres — inclusive, comandando Saneamento Básico: O Filme (2007), que teve a atriz como uma das protagonistas — reforça que os votantes do Oscar tem outras ambições, ao contrário do Globo de Ouro, que é definido por jornalistas:
— A Academia tem muitos interesses econômicos por trás. O prêmio vale dinheiro para a indústria, que é estadunidense. Mas eu tenho muita esperança de que tanto a Fernanda quanto o próprio filme estejam entre os concorrentes. Só isso já vai ser incrível. Estar no Oscar é mais uma divulgação para o cinema nacional.
Para o cineasta, ainda, a importância de um filme sobre os horrores da ditadura estar ganhando projeção internacional também serve como uma preservação da memória para o público mundial — para que o que é visto na telona nunca se repita.
— Antes de tudo, é um filme muito bom, que atrai um grande público. Ele fala sobre a ditadura e não apenas para as mesmas pessoas. Eu o relaciono um pouco com o Desaparecido, do Costa-Gavras, que revelou aos americanos, o apoio que o governo dava para as ditaduras latino-americanas. E o Ainda Estou Aqui fala sobre como é viver em uma ditadura — complementa Furtado.
E, talvez, seja este assunto que, apesar de retratar uma história brasileira, converse com o mundo todo, possa dar ao país o seu primeiro Oscar.
— Muita gente achava que seria improvável a Fernanda Torres vencer todas aquelas grandes atrizes e ela foi e ganhou. Então, a gente pode estar achando talvez improvável que o Ainda Estou Aqui ganhe o Oscar e, lá para a frente, ele consiga ter aquela simpatia dos votantes. Eu estou esperançoso, tanto para indicações como por prêmios. Acho que a gente pode trazer um Oscar para o Brasil, que é o que a gente está querendo desde 1998, com Central do Brasil — finaliza Rodrigo de Oliveira.