Com o fechamento de fronteiras terrestres e aéreas decretado em vários países em meio à pandemia de coronavírus, milhares de turistas brasileiros têm de lidar com a falta de voos de volta, sem poder sair de seus abrigos devido à quarentena e sem saber quando conseguirão retornar para casa.
Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), 11 mil brasileiros já se cadastraram no site da agência informando que estão com problemas para retornar ao Brasil. Casos já são conhecidos em todos os continentes. Demian Bernardes é uma dessas pessoas. Gaúcho de 35 anos, ele morava na Austrália, viajou em 28 de fevereiro para a Tailândia e retornaria direto para o Brasil. Agora, tem enfrentado dificuldades para voltar a sua terra natal.
Conforme o Itamaraty, Demian é um dos 320 brasileiros no país asiático. O gaúcho publicou um vídeo em seu Facebook pedindo ajuda para deixar o sudoeste da Ásia o mais rápido possível. Ele relata que as passagens foram canceladas e o país estará completamente fechado a partir de quinta-feira (26). Além disso, seu visto está para vencer no dia 28 deste mês, o que pode causar problemas se permanecer na Tailândia.
— O número de brasileiros tem crescido aqui. Sei de muitas pessoas em outros países, como Camboja e Malásia. O grupo maior está aqui, estamos tentando fazer com que todos venham para Bangcoc. O pessoal do consulado tem sido bastante solidário, mas algumas coisas eles não conseguem resolver. Acho que precisaríamos de uma força maior, como o presidente ou, então, os ministros — salientou.
Demian relatou também que havia comprado uma passagem para retornar ao Brasil pela Emirates Airlines, mas que, no dia seguinte, foi cancelada pela companhia aérea.
— Não tem nenhum voo disponível. Antes disso, os voos estavam com valores absurdos. O pessoal começou a trocar voos. Comprei o meu três dias antes do embarque, mas eles cancelaram um dia depois. As companhias não têm nos ajudado. Apenas mandam a gente preencher um formulário para depois receber o valor inteiro ou parcial. Estamos bem unidos. Amanhã (quinta) vou encontrar outro grupo, os hotéis estão fechando. Vamos juntar o pessoal até eles resolverem a nossa situação — afirmou.
A maior preocupação dos brasileiros é que o país asiático entrará em isolamento total a partir de quinta-feira, o que irá fechar hotéis e supermercados. O primeiro-ministro tailandês, Prayut Chan-ocha, anunciou que o período deverá durar até 30 de abril, o que possibilitaria o retorno ao Brasil apenas em maio. A Tailândia tem 934 casos ativos de coronavírus.
— O ponto mais crítico é o fechamento do país, dos hotéis, dos supermercados e das coisas úteis que podem nos ajudar. Isso nos preocupa bastante. O pessoal está cada um por si. Na quinta, devo encontrar mais brasileiros. A situação está crítica, porque muita gente vem só de mochila para cá, sem muito dinheiro sobrando. A embaixada criou um grupo no WhatsApp para nos manter atualizados — disse Demian.
Neste grupo (já são dois), o Itamaraty anunciou, na manhã desta quarta-feira, que a Ethiopian Airlines disponibilizará um voo saindo de Bangcoc com destino para São Paulo no dia 28 de março. Para isso, os brasileiros teriam que arcar com um custo de mais de US$ 2 mil. O gaúcho afirma que não irá viajar neste voo.
— É muito caro. Já perdi uma passagem da Emirates e ainda não fui reembolsado. Não tenho como pagar isso. Pelo que o pessoal está falando aqui no grupo, nenhum brasileiro vai pagar isso — ressaltou.
O Itamaraty garante, porém, que permanece trabalhando para retirar todos os brasileiros não residentes na Tailândia.
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De Kombi pela América do Sul
Não tão longe daqui, mais gaúchos passam por dificuldades similares às de Demian. Fazendo uma viagem de Kombi pela América do Sul desde maio de 2019, Manoela Petry e seu marido, Rodrigo Arnhold, ambos de Montenegro, atualmente estão morando em uma praça no bairro La Floresta, em Medellín, na Colômbia. A previsão é que eles não possam sair de lá até o dia 13 do próximo mês.
— Nós nos registramos com a embaixada brasileira aqui e fizemos um pedido coletivo com outros brasileiros que também estão de carro para conseguirmos sair todos juntos, por uma rota pré-determinada e aprovada por todos os países que devemos passar (Colômbia, Equador e Peru). Até agora, nos falaram que estão buscando resolver nosso problema, mas não tivemos mais retornos — relata Manoela.
Segundo ela, a embaixada tem ajudado, inclusive disponibilizando uma lista com lugares que seguem abertos no país. A maioria, no entanto, está em Bogotá, a mais de 400 quilômetros de distância da cidade onde Manoela e seu marido estão. No país, o governo já conseguiu trazer de avião alguns brasileiros, mas a gaúcha precisa retornar com seu veículo.
A viagem não terminaria em Medellín. Eles pretendiam viajar até a Venezuela e entrar no país pelo norte.
— Vinha tudo muito tranquilo. Nunca se espera estar em meio a uma pandemia, ainda mais longe de casa e da nossa família — finalizou.
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Grupo detido em aeroporto
Em Punta Cana, na República Dominicana, um grupo de mais de 50 brasileiros está retido no aeroporto da cidade há mais de uma semana. Mônica Luz Becker, gaúcha de Porto Alegre, está desde a última sexta-feira dormindo no local. Ela relata que a embaixada contatou os brasileiros uma única vez e não os procurou mais.
— Existe a possibilidade de existir um voo da Gol na sexta-feira que vem, mas eles buscariam só o pessoal que comprou passagem com eles. Tem muita gente que adquiriu com outra companhia. Estou rezando para que nos levem. Posso comprar uma nova passagem, se for o caso. A embaixada não tem nos ajudado. Sumiram depois do primeiro contato — conta Mônica.
Na África do Sul dezenas de brasileiros também não conseguem voltar ao país e permanecem em hotéis de Johannesburgo, de acordo com a embaixada brasileira nesta quarta-feira (25).
A companhia aérea Latam reduziu em 90% seus voos a partir da África do Sul, em meio à pandemia.
Segundo o consulado brasileiro, o número de turistas que tinham se registrado na embaixada antes do voo de terça era de 350. Gustavo Carneiro, chefe do consulado, explicou à AFP que deste total não se sabe quantos conseguiram viajar e quantos foram obrigados a ficar.
— Pelo momento, parece que todo mundo tem um bilhete para o próximo voo — indicou.
A reclamação é que todas as outras nações buscaram seu repatriados nos últimos dias, e o Brasil ainda não fez o mesmo. Além disso, conforme relato nas redes sociais, muitos integrantes, entre eles idosos e hipertensos, estão no grupo de risco do coronavírus.
O Itamaraty alega que a Embaixada do Brasil em Santo Domingo continua trabalhando para assegurar o retorno de todos os brasileiros atingidos pelas restrições de movimentação e afirma que se trata de uma situação excepcional, sem estabelecer cronograma preciso dos voos ou de atendimento.
A última estatística disponível dá conta de cem brasileiros ainda retidos na República Dominicana.
Ilhado, mas ainda sem querer voltar
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Gabriel Bassanesi, gaúcho radicado em São Paulo, resolveu, junto com a sua esposa, fazer um período sabático em 2020. Antes mesmo de a pandemia eclodir no mundo, eles partiram do Brasil com o seguinte roteiro planejado: África, Oriente Médio, Nepal, Sudeste Asiático, e acabariam na Austrália. A viagem teria duração de cerca de seis meses.
— Saímos do Brasil e não tinha nenhum caso ainda. Fizemos África do Sul, Lesoto e Suazilândia. Quando chegamos à Zâmbia, vimos que a situação começou a ficar ruim. Depois do Zimbábue, fomos escalar uma montanha no Malaui e ficamos três dias sem internet. Nos conectamos novamente e vimos como estava o mundo. Toda Ásia estava fechada. Pensamos em ir para as Ilhas Maurício, um dos países mais ricos do continente e que ainda não tinha nenhum caso — conta Gabriel.
Eles chegaram ao país em 18 de março, e um dia depois foi anunciado que as fronteiras estavam fechadas. Primeiro, alugaram um quarto em um hotel, que logo foi cancelado. Optaram por pegar um outro apartamento, fazendo compras para 10 dias de isolamento social:
— Depois, descobrimos que todos os voos estavam cancelados até 30 de abril e não podemos mais fazer compras até 31 de março. Falei com uma pessoa na embaixada na terça, ela foi bem solícita e me ajudou.
Ele e sua esposa ainda não têm o objetivo de retornar ao Brasil. O plano é seguir viagem até o fim de agosto. No entanto, reconhecem que, se a situação não melhorar, terão que voltar ao país.
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