O celular não está tocando. Os programas de bate-papo online estão ociosos. Os preservativos continuam embalados. As pessoas pararam de abordar Denny para pagar por sexo.
- Em Dongguan, temos algo chamado serviço no estilo Dongguan, declarou o jovem de cabelos castanhos tingidos, concordando em falar na condição de que fosse divulgado apenas seu apelido em inglês. - Esta cidade é a capital do sexo. Temos uma reputação. É como se você tivesse uma certificação ISO 9000 - uma referência ao padrão internacional de qualidade para a indústria de serviços.
- Agora tudo acabou, afirmou ele.
A China está enfrentando a mais dura campanha antidepravação em anos, e a repressão está cobrando seu preço na economia de Dongguan, uma cidade com mais de oito milhões de habitantes. Ela é um centro de produção para exportação e uma Meca para trabalhadores migrantes, mas é a também a capital do pecado no país. Agora, a indústria da luz vermelha local está em dificuldades.
Casas noturnas e de massagens, em hotéis cinco estrelas ou becos escuros, foram fechadas. Motoristas de táxi que ganhavam comissões de bordéis sofrem com a falta de dinheiro. Alguns proprietários vêm tendo dificuldades para alugar apartamentos, à medida que prostitutas deixam a cidade ou decidem não voltar das férias do Ano Novo Lunar.
A repressão é tão severa, e a indústria sexual em Dongguan é tão grande, que policiais da vizinha Hong Kong têm manifestado preocupação sobre uma possível enxurrada de prostitutas desalojadas indo para lá.
A campanha parece ser o mais novo elemento de um amplo esforço do presidente Xi Jinping, chefe do partido Comunista, para apagar a imagem de corrupção associada às autoridades chinesas.
Em fevereiro, o Ministério da Segurança Pública em Pequim prometeu atacar duramente os "três vícios" - prostituição, apostas e uso de drogas -, mas o foco da iniciativa está claramente na venda de sexo.
A campanha nacional começou em 9 de fevereiro, quando a China Central Television veiculou uma matéria com repórteres disfarçados mostrando a prostituição em hotéis de Dongguan. No dia seguinte, o chefe do partido na província de Guangdong, que inclui Dongguan, ordenou o fechamento de locais de entretenimento na cidade por três meses. A polícia invadiu algumas saunas, casas noturnas e bares de caraoquê - os tipos de locais com reputação de imoralidades por toda a China.
Hotéis de marcas internacionais não foram poupados. O Sheraton local tem um espaço para massagem nos pés, no quinto andar, que foi fechado, e o spa ao lado dele exibe faixas policiais nas portas. (Um gerente do Sheraton explicou que uma empresa terceirizada administrava o spa, embora uma ligação ao telefone do estabelecimento tenha sido atendida pelo departamento de serviços aos hóspedes do Sheraton.)
O Ministério da Segurança Pública chinês ordenou que delegacias de todo o país conduzam operações similares. Uma piada popular diz que, para conter uma recente onda de gripe aviária, Xi disse "livrem-se das galinhas", mas a ordem foi enviada ao Ministério da Segurança Pública, em vez do Ministério da Saúde - e os policiais acharam que ele estava se referindo a prostitutas.
Até agora, a maior baixa política foi o chefe de polícia de Dongguan, Yan Xiaokang, que foi demitido e colocado sob investigação. No entanto, são as prostitutas que vêm enfrentando as piores consequências.
- Essa é a campanha mais séria até hoje. E é igual em todo lugar, então não podemos nem partir para outras cidades, afirmou um amigo de Denny, um garoto de programa com boné de beisebol e unhas pintadas de preto.
Antes da repressão, segundo o amigo de Denny, ele conseguia ganhar mais de US$100 em uma noite boa. Contudo, hoje ele tem receio do contato de possíveis clientes, pois eles podem ser policiais buscando pessoas para prender. Os clientes têm o mesmo medo.
No início da campanha, em 10 de fevereiro, a polícia de Dongguan anunciou que eles haviam inspecionado quase 2.000 locais de entretenimento na cidade, definindo 39 deles como "estabelecimentos amarelos" (na China, amarelo é uma gíria para erótico) e prendendo 162 pessoas. Nos primeiros seis dias, de acordo com o site do Ministério de Segurança, mais de 2.400 estabelecimentos amarelos foram fechados em todo o país, 73 redes de prostituição foram desmanteladas e mais de 500 pessoas foram detidas.
A indústria do sexo é mais desenvolvida em Dongguan do que em outras cidades chinesas, segundo estudiosos, prostitutas locais e o programa da China Central Television - que recebeu críticas por mostrar prostitutas sem ocultar seus rostos.
As casas noturnas oferecem cardápios com dezenas de serviços, alguns com nomes que trazem floreios poéticos tipicamente chineses. Duas horas com uma mulher em um local elegante geralmente custa 1.000 renminbi, o equivalente a cerca de US$160. O cliente pode contratar uma prostituta como amante exclusiva: um anúncio de emprego nas ruas de Houjie dizia que a contratada poderia receber de US$1.640 a US$4.900 por mês. O mesmo anúncio afirmava que uma princesa da sala, a mulher que oferece drinques aos clientes nos clubes de caraoquê, poderia ganhar US$1.300 por mês, mais gorjetas. A clientela se estende para além do continente: homens de negócios de Taiwan e outras partes da Ásia muitas vezes incluem uma parada em Dongguan em suas viagens à China.
- Não acho que Dongguan tenha mais prostitutas ou as mais caras, mas a cidade definitivamente possui a indústria do sexo mais avançada e madura, argumentou Ai Xiaoming, professor de Literatura e Estudos de Gênero na Universidade de Zhongshan em Guangzhou, a capital da província.
Nas casas noturnas ao longo da faixa leste do centro, conhecida como Rua dos Bares, os negócios são inexistentes. Todas as portas foram lacradas com faixas de papel branco trazendo o selo da polícia e datadas 14 de fevereiro - o dia dos namorados. Recentemente, durante uma tarde, dezenas de jovens funcionários de uma casa noturna, a Vee Plus, se reuniam em frente às portas, esperando coletar pagamentos atrasados.
- Em Dongguan, duas a cada cinco pessoas perderão seus empregos se a situação não voltar ao normal, disse Lin Yadong, gerente de uma casa noturna. Uma mulher ao seu lado completou: - Se não reabrirmos, como vamos comer?
Lin contou que a casa empregava mais de 70 pessoas, e que que os clientes vinham para beber, jogar dados e ouvir música, e não para pagar por sexo.
No Cannes, uma casa concorrente, um contador que deu apenas o sobrenome, Huang, afirmou que a repressão era um "sofrimento real - ninguém sabe se vai para casa, permanece aqui ou vai para algum outro lugar procurar trabalho".
- O governo está tentando descobrir o que fazer com a indústria. Eles estão embaralhando as cartas, acrescentou ele.
Um gerente do BB Club estimou que o fechamento estava custando ao seu negócio cerca de US$10 mil por dia, em despesas e receita perdida. - O governo fez isso por motivos secretos, argumentou ele, e rapidamente afastou um repórter estrangeiro do prédio enquanto autoridades da agência de cultura local entravam para uma inspeção.
Segundo um motorista particular, os hotéis e clubes da cidade não seriam viáveis sem a indústria do sexo. - Quem vai a um bar se não houver garotas? questionou ele. - Você não pode servir bebidas alcoólicas quando não há garotas com quem beber. O motorista, que deu apenas seu sobrenome, Liu, disse que chegava a fazer US$120 por noite em comissões de bordéis por trazer clientes. - Isso afetou todos os motoristas, garantiu ele.
De baixo do apoio de braço em seu carro, Liu puxou uma pilha de folhetos com fotos de mulheres nuas, números de telefone e listas de serviços. Ele contou que, certa vez, um homem de Singapura pagou para fazer sexo com cinco mulheres de uma só vez. Atualmente, disse ele, um cliente teria sorte de conseguir os serviços de uma única mulher em Dongguan.
Turismo sexual
Indústria do sexo é severamente reprimida em Dongguan, na China
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