No princípio, trevas cobriam a face do abismo, e então Deus criou o céu e a terra, e separou a luz da escuridão, e fez Adão e Eva, e viu que era bom, e descansou no sétimo dia – exatamente como vem na Bíblia, crê Josué Carvalho Moraes, morador de Viamão, formando do Ensino Médio em uma escola adventista. Namoro começa como uma amizade e tem o propósito de conhecer a outra pessoa para um relacionamento sério, de preferência quando o rapaz já estiver trabalhando, para poder levar a moça para sair. Sexo, só depois do casamento.
– O que eu vejo hoje é que só pensam em se divertir, só querem ficar e traem muito. Olham a pessoa e só veem a beleza. Não pensam numa coisa séria. Eu gosto de coisa séria. Os colegas falam que já fizeram sexo e outras coisas, eu só fico quieto. Sexo era para ser algo bom, né? Mas acaba que para eles não vai ser. Porque eles estão estragando isso agora – afirma.
Josué, 17 anos, ficou contente quando o Santander Cultural fechou a mostra Queermuseu, sob pressão do MBL, um grupo conservador que ele segue com admiração no YouTube e no Facebook. Na avaliação dele, a exposição tinha "homossexualismo e muita pornografia", e as crianças e adolescentes podiam ver e se sentir incentivadas a virar homossexuais também. Que bom que, quando ninguém estava prestando atenção, alguém foi lá e desmascarou tudo isso!, pensa Josué, afinal, já não bastam as telenovelas fazendo propaganda gay?
– A sociedade tem muita gente se convertendo para esse lado. Acho que primeiramente é a TV, principalmente as novelas, que incentiva isso. É ruim porque, na minha opinião, isso não seria o certo. O certo seria homem com mulher e mulher com homem. Conheço gays. Converso com eles, normal. Respeito. Na minha turma tem dois. Mas acho que eles estão errados. Poderiam ser diferentes, mas hoje tem esse negócio de que, quando tu nasces, tu podes escolher. O negócio está assim hoje. Vai ter muito mais gente assim futuramente. Aí vou dizer que o Brasil está perdido.
Esses pontos de vista são uma das razões que Josué aponta para apoiar seu ídolo político, Jair Bolsonaro, o homem que ele quer ver no comando do país. Mas antes de falar em política ele sonda o terreno. "Não sei se tu és petista", joga verde, e em seguida a uma pausa vai direto ao ponto: "Tu és petista?". Uma vez que se tranquilizou a esse respeito, conta que não gosta de Lula, de Dilma, do PT, que associa todos eles à corrupção.
Se Lula se candidatar em 2018 e for eleito presidente, Josué deve se mudar para Portugal, por causa do idioma e por causa de um primo que foi pra lá e que manda informações encorajadoras via internet.
– Sinceramente, eu não gosto do Brasil. Vejo as notícias, e pelo jeito que as coisas estão não dá para ficar. Agora estou estudando História e descobri que desde José Sarney tem essa corrupção. Eles roubam, e a gente que sofre. O Lula, no governo dele, sempre fez tudo para agradar as pessoas, criando Bolsa Família, Enem, mas por outro lado ele estava roubando. Fazendo uma chantagem, né? Assim: "Vocês não podem me tirar, porque se vocês me tirarem vão perder todas essas coisas que eu fiz".
Era melhor antes. No tempo dos meus pais se via muito o que era certo e o que era errado. Hoje cada pessoa está pensando de uma maneira diferente.
Josué Carvalho Moraes
A solução é Bolsonaro, em quem Josué planeja dar o primeiro voto da vida, no ano que vem, mas não só ele, porque o adolescente acredita que a saída não precisa ser pela democracia, poderia ser por uma tomada do poder pelos militares, ainda que a ditadura tenha lá seus inconvenientes.
– Não vejo outra solução. Porque daí eles vão implantar novas leis, acho. Todos esses ladrões seriam presos. Não só ladrão que rouba e assalta bancos. Até mesmo ladrão que está no governo. Rouba, paga uma fiança lá e depois é solto. Isso acontece um monte. E as pessoas acabam fazendo de novo e de novo. O lado ruim é que pessoas que muitas vezes não têm nada a ver com isso podem ser prejudicadas. Vai ter militares na rua para cuidar desse negócio. Eu me lembro de umas fotos de pessoas que acabaram apanhando nas ruas, em meio às outras pessoas. Daí com certeza vão surgir mais protestos, mais movimentos, isso que é o problema.
Josué diz que a maioria dos colegas é de direita, mas há muita resistência entre as gurias, que não gostam do Bolsonaro, que acham que ele é muito machista. Josué concorda, ele é machista, sim, dá para ver isso em todas as entrevistas, em todos os vídeos, mas não considera isso assim tão importante, porque para ele "tem de olhar para o Brasil como um todo".
Além do terceiro ano do Ensino Médio, Josué frequenta à noite o cursinho popular Zumbi dos Palmares, como forma de preparação para o vestibular, que pretende fazer em Design Gráfico ou em Publicidade e Propaganda. Frequenta a Igreja Adventista e considera que "religião é igual à vida", que tudo começa nela, que é ela que embasa as decisões e orienta sobre o que é bom e o que é ruim. Tinha um colega ateu e não conseguia se acertar com ele, posto que não vê sentido em ser ateu.
– A pessoa não acredita em nada! Parece que nasceu e não tem objetivo. É só viver por viver.
A geração dos pais era melhor do que a dele, está convencido, porque agora falta respeito pelos outros, falta educação, valores se perderam, os jovens se viciaram em internet.
– Acho que era melhor antes. No tempo dos meus pais se via muito o que era certo e o que era errado. Hoje cada pessoa está pensando de uma maneira diferente – critica.
Raio X
Josué Carvalhos Moraes, nascido em 30/10/2000
Uma prioridade: "Estudos
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