A era do medo
Havia menos medo em 2000. Ninguém se assustava com uma mochila esquecida em um lugar públicos, os islâmicos eram considerados uma comunidade religiosa como qualquer outra, os conflitos armados ocorriam em regiões periféricas a que não se prestava muita atenção, e a principal preocupação dos Estados Unidos no plano externo consistia em criar uma espécie de escudo contra mísseis para proteger países aliados na Europa.
O divisor de águas foram os atentados de 11 de Setembro de 2001, quando terroristas islâmicos sequestraram aviões comerciais e se chocaram contra as Torres Gêmeas, em Nova York, e contra o Pentágono, na Virgínia. Com a queda das torres, transmitida ao vivo para uma humanidade em choque, caiu também um mundo. E outro surgiu.
Na nova realidade, existiam Bin Laden, Al Qaeda, talibãs e, mais tarde, o Estado Islâmico. Havia ataques de radicais islâmicos nas grandes capitais do mundo desenvolvido, em Londres, Madri, Paris, Bruxelas. Ninguém se sentia seguro.
Veio a "guerra ao terror", que incluiu uma mal explicada invasão ao Iraque, vigilância onipresente, medidas de segurança que transformaram em maratona o embarque em um avião, leis que tornaram aceitável o que antes eram violações graves à privacidade, desconfiança em relação aos muçulmanos, xenofobia, restrições à imigração e o que foi definido como um choque de civilizações, com o Ocidente de um lado e o Islã do outro.
A era da internet
Em 2000, 248 milhões de pessoas tinham acesso à internet, o equivalente a 4% da população mundial. Conexões discadas, com modens ruidosos, tornavam a experiência um exercício de paciência. Fazia-se isso em pesados computadores de mesa. Pesquisava-se em sites como o Cadê, o Altavista e o Yahoo. Quem queria publicar, tinha um blogue. A principal funcionalidade era o e-mail.
O número de usuários e a velocidade das conexões não pararam de crescer a partir dali. Apenas três anos, depois já havia o triplo de internautas. Atualmente, são quase 4 bilhões, mais da metade da população mundial.
As pessoas começaram a acessar em celulares, tablets, notebooks e aparelhos de TV. O Google tornou-se onipresente como ferramenta de pesquisa. A Wikipédia (2001) substituiu as pesadas, caras e muitas vezes desatualizadas enciclopédias de papel. As listas telefônicas perderam sentido.
O e-mail expandiu-se até sair de moda, substituído por plataformas de conversação em tempo real, como o Messenger. Ficou fácil publicar e ter uma presença online, graças às redes sociais. Vieram o Facebook (2004), o YouTube (2005), o Twitter (2006), o streaming via Netflix (2007), o Instagram (2010). Todo mundo ficou conectado. O comércio, os serviços, o entretenimento e a informação tornaram-se online, à distância de uns cliques.
A era do smartphone
No ano 2000, você tirava fotos com uma câmera feita só para esse fim. Na maior parte dos casos, ela capturava a imagem em rolos de filme com um número reduzido de poses, que depois precisavam ser revelados e impressos em papel. Para fazer vídeos, também tinha de possuir um equipamento específico, no qual metia uma fita para a gravação. Tais fitas também serviam para gravar sucessos do cinema, e você as alugava para poder assistir em casa. Você tinha um gigantesco televisor de tubo que sintonizava um número limitado de canais e escutava música em discos, num aparelho portátil à pilha chamado de discman. Você precisava de um console para jogar os melhores games. Quando ia a algum lugar desconhecido, você usava um mapa, e era quase certo que ia se perder. Para chamar um táxi ou pedir uma pizza, você telefonava. Os telefones celulares estavam disseminados, mas serviam para um coisa só, telefonar.
Algum tempo depois, todas essas funções passaram a ser realizadas por um único aparelho, que cabe no bolso e metade da humanidade já possui: o smartphone. Porque uma coisa é a internet, e outra diferente é a internet depois da popularização do smartphone.
As tecnologias já vinham confluindo nos anos anteriores, mas o momento da virada foi em 2007, quando a Apple lançou o iPhone, o mais icônico dos smartphones. A partir dali, fazer ligações virou apenas mais uma função do celular. Ele passou a ser também câmera fotográfica, câmera de vídeo, videogame, TV, aparelho de música, shopping, livro, jornal, GPS e quase tudo mais que se possa conceber. Com ele vieram o WhatsApp, o Snapchat, o nude, o Uber e um universo sem fim de aplicativos.
A era das minorias com voz
Negros, homossexuais e mulheres sempre sofreram preconceito e discriminação, mas em 2000 eles eram mais impotentes em relação a isso, e muitas vezes sofriam calados. O assédio às mulheres, na rua ou no ambiente de trabalho, por exemplo, não causava maior escândalo, e o discurso machista muitas vezes nem era percebido como tal. Os negros estavam segregados, em desvantagem para ascender na sociedade brasileira. Os gays preferiam se manter no armário, porque de outra forma não eram aceitos.
Nenhuma dessas realidades foi resolvida, mas mesmo assim muita coisa mudou. Esses grupos ganharam voz, com ajuda das redes sociais, e reuniram força, amparados em leis e decisões judiciais. De forma inédita, um negro virou presidente dos Estados Unidos, e uma mulher, do Brasil. Houve um despertar da consciência e da militância, que mudou o discurso e os padrões do que é aceitável.
Entre as mulheres, que passaram a ser protegidas pela Lei Maria da Penha (2006) e conquistaram o direito ao aborto no caso de anencéfalos (2012), surgiu uma espécie de levante feminista, que alcançou vários estratos da sociedade, entrou em todos os lares brasileiros, denunciou uma cultura de assédio e colocou em situação delicada figuras acusadas de machismo.
No caso dos negros, o florescer do ativismo não foi diferente, e houve uma conquista importante com a reserva de cotas em universidades públicas, que se disseminou a partir do ano 2000 e foi sacramentada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012. O chamado movimento LGBT também explodiu, e declarar-se gay, no Brasil, já não é um estigma que significa perder o emprego e envergonhar a família. A Justiça autorizou que homossexuais casassem e tivessem direitos idênticos os de casais héteros. Eclodiu uma fase de liberdade para explorar a sexualidade e o gênero, entre os mais jovens.
E como era de esperar, diante do avanço dessas agendas, veio a reação: uma onda de conservadorismo, segundo a qual cotas para negros são uma afronta à meritocracia, o discurso feminista não passa de "mimimi" e tratar de homossexualidade em uma exposição de arte é inaceitável.
A era do aquecimento global
Todo mundo já falava de aquecimento global, no ano 2000, e uma prova de que o assunto era levado a sério está no Protocolo de Kyoto (1997), o tratado internacional para reduzir as emissões de gases do efeito estufa. Mas acreditava-se, inclusive no meio científico, que as consequências do aquecimento global seriam sentidas, se nada fosse feito, apenas pelas futuras gerações.
O problema logo revelou-se mais sério do que se pensava, e a geração nascida a partir do ano 2000 conheceu um mundo abalado por catástrofes atribuídas às alterações climáticas. Segundo a Agência Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos, desde o início do século 21 o recorde de ano mais quente da história foi quebrado nada menos do que cinco vezes: em 2005, 2010, 2014, 2015 e 2016.
Uma das mudanças mais alarmantes foi o derretimento das calotas polares, em velocidade muito mais veloz do que a prevista pelos modelos de mudança climática. A extensão de gelo no Ártico atingiu a menor marca da História, e icebergs colossais, um deles do tamanho do Distrito Federal, desprenderam-se da Antártica.
As tragédias naturais – secas, tempestades, extinção de espécies – aumentaram em quantidade e virulência. Um furacão foi registrado pela primeira vez no Atlântico Sul (o Catarina, em 2004). No mês passado, o Caribe e a América do Norte enfrentaram três furacões simultâneos (Katia, Irma e José), que arrasaram países e regiões. O Relatório Especial Ciência e Clima, do Programa de Investigação da Mudança Global dos Estados Unidos, não deixou dúvidas: afirmou que a atividade humana contribuiu para o aumento da temperatura global e, consequentemente, para a incidência de furacões.
É um mundo frágil e assustador este em que nasceu a geração 2000, uma geração especialmente sensível à questão do ambiente e da sustentabilidade.