
Serena Rees, fundadora da Agent Provocateur, que fez fortuna na década de 1990 ao criar uma lingerie diferente que ficava a mostra, sentou-se no sofá de veludo da sua casa da cidade de Marylebone. Ela refletia sobre o poder da reinvenção.
– Depois de vender a Agent Provocateur há uma década, fui abordada por concorrentes e potenciais parceiros pedindo que voltasse para o ramo da intimidade – contou ela. – Mas nada me pareceu bom.
– Pareceu-me que eu já havia feito tudo – explicou, abraçando as pernas, vestidas com calças de ginástica pretas de tecido sedoso e sapatos de saltos altos com os dedos de fora.
No entanto, depois de anos observando a maneira como seus filhos e enteados se vestem e compartilham roupas, mudou seu ponto de vista.
– As crianças que vivem nesta casa e seus amigos que a frequentam têm uma visão muito diferente das gerações anteriores sobre como se vestir, como se comportar, como sair com colegas e paqueras e sobre suas atitudes em relação ao sexo e à sexualidade – ela disse. – Eu vi o que o mercado oferece atualmente e senti como se houvesse uma grande desconexão. Victoria's Secret e Agent Provocateur não são mais relevantes para eles.
O resultado é um novo rótulo chamado Les Girls Les Boys. A coleção de 100 peças sem-gênero, íntimas e de rua, foi desenhada para ser usada por homens e mulheres. Promete levar seus usuários da geração millennial da "cama para rua", de acordo com seus estilos de vida com limites flexíveis e uma abordagem mais informal da roupa do que as gerações anteriores.
Leia mais:
Desigualdades raciais e de gênero se mantêm no país, aponta estudo
Em Botswana, uma equipe de guias quebra as normas de gênero e faz sucesso
Nos últimos anos, uma mudança decisiva no sentido de se afastar da aparência de boneca inflável a favor de uma estética unissex foi exibida em todas as passarelas de coleções prontas para vestir. É um movimento positivo, disse Rees, e também um claro sinal dos tempos e de reação a eles.
– A última década viu o surgimento de imagens corporais totalmente inatingíveis e hipersexualizadas, especialmente para as mulheres, alimentadas pela era da internet, das mídias sociais e da cirurgia plástica – afirma Rees, ex-nora de Vivienne Westwood. (Rees fundou a Agent Provocateur em 1994 com seu ex-marido, Joe Corré.)
– É errado e é preocupante porque torna as pessoas tão infelizes e inseguras. De uma maneira estranha, eu me sinto um pouco responsável por isso.
Quando ela inaugurou a Agent Provocateur, há 23 anos, Rees esperava que as mulheres conseguissem assumir o controle de sua sexualidade e a forma como a exibiam em público e privado. Uma brincadeira que misturava estilo e alguma obscenidade, apresentando espartilhos de cetim, alças de sutiã bordadas e que raramente apareciam descaradamente na vitrine. Todas essas poderiam ser ferramentas de libertação, raciocinava Rees.
– Exceto pelo fato das pessoas se deixarem levar ao longo dos anos – explicou num tom claramente desaprovador balançando seus cachos escuros. – Agora essa história chegou longe demais. A Les Girls Les Boys foi projetada para ser a antítese de tudo isso.
O projeto começou há 18 meses, quando Rees viu que os millennials em torno dela já estavam revolucionando seu guarda-roupa.
– Muitos deles já parecem entender que não precisam estar à altura dessas imagens – disse ela. – Nossas roupas são ferramentas para ajudá-los a se sentir totalmente à vontade para expressar quem eles são, suas escolhas de vida, abordar os relacionamentos e o fato de que a coisa mais linda do mundo pode ser a juventude.
– Principalmente quando as pessoas estão relaxadas mental e fisicamente – afirmou ela com um sorriso. – Essas crianças são criaturas de conforto, mas ainda se preocupam com a aparência. E isso me estimulou novamente. Eu realmente queria fazer parte disso.

A primeira coleção da marca de roupa de baixo, bodies, calças de moletom e pijamas, que custam de US$25 a US$143, será comercializada online pela marca e em lojas como Nordstrom e Selfridges.
Rees pareceu otimista sobre o futuro.
– Ouça, não tenho nada para ganhar ou perder fazendo isso – explicou. – Eu tenho uma vida ótima. Mas tem sido um verdadeiro trabalho de amor e uma reação genuína ao clima social e político em que vivemos atualmente. Tantas marcas ficam presas a seus estilos: eles não olham mais para o que está acontecendo no mundo lá fora. Nós realmente estamos fazendo isso. E, espero, as pessoas vão ouvir.
Por Elizabeth Paton, do The New York Times