Marcia Beatriz Bertuol
Psicóloga, coordenadora do evento
Dia após dia, pessoas de diferentes idades, experiências, dores e alegrias passam pelos consultórios de psicoterapia. O que as move? As histórias são únicas. Contam do tecido social tramado no convívio com a família, que vive em uma comunidade, em um tempo histórico, uma cultura. Cada hora, para o terapeuta, é uma viagem por territórios desconhecidos, cheios de surpresas. Ou não. Para olhares e ouvidos desatentos, pode parecer o lugar de sempre. As mesmas histórias, as mesmas mães. Afinal, dizem que filho é tudo igual, só muda o endereço. E dizem o mesmo das mães!
Mas, quando a atenção está presente, o parecido se revela diferente. Para cada ser humano há um traçado próprio. A aventura de escutar e olhar tem um potencial de revelação a todo momento. Essa diversidade sempre apresenta algo que é comum. As necessidades básicas (fome, abrigo, higiene, contato) e as emoções naturais (medo, raiva, repulsa, tristeza, alegria, afeto) estão presentes em cada um. Fazem parte do equipamento natural de sobrevivência, orientando as escolhas da vida. O medo faz seu papel ao alertar para as ameaças – e pode levar à fuga. Quando fugir não é possível, rapidamente o medo se transforma em raiva, e a resposta para a sobrevivência passa a ser a luta.
No entanto, os medos que as pessoas levam para seus tratamentos nos consultórios relacionam-se às perdas: o ser amado, o trabalho, o dinheiro, o status. Medo da rejeição, de ser ignorado, de adoecer, de depender, de sofrer dores. Medo de barata, elevador, avião. E, com uma frequência surpreendente, medo de gente, de ter e de não ter relações. Medo de amar, da traição, do abandono, de não ser amado. Medo de dizer o que sente e pensa.
Hoje, o medo das pessoas é alimentado pela violência social. Não só o risco de assalto, sequestro, estupro. Mas a tristeza de ver os recursos públicos espoliados e transformados em presentes, obras de arte e depósitos em contas no estrangeiro. A violência de saber que os representantes políticos cuidam apenas, e desavergonhadamente, de seus bens particulares. A violência sistemática da mentira. A violência gerando mais medo, que alimenta ainda mais violência. Medos que aparecem como ansiedade. Ansiedade que pode alcançar os picos do pânico.
Por que esse gênero de medo se traveste de ansiedade? Porque a ansiedade representa o medo do que imaginamos que possa acontecer.
Uma espécie de adivinhação do futuro. O interessante – talvez cruel – é que só podemos pensar no que conhecemos. Então, a “futurologia ansiosa” é uma projeção do próprio passado.
Nesse cenário, a esperança pode surgir com a fantasia da segurança. “Vou estar bem se estiver seguro.” Seguro se não perder ninguém, nem nada. Essa associação pode levar ao isolamento e a soluções que bloqueiam ou inibem o contato com o outro: “É mais seguro não falar o que sinto e penso, para evitar a rejeição e a crítica. É mais seguro não sair de casa, para evitar os assaltos. É mais seguro não amar, para evitar ser traído”…
O isolamento, gerado pelo medo e alimentado pela violência, é uma das maiores causas de sofrimento psíquico. Como seres sociais, somente somos humanos na relação com outros humanos. E o elemento essencial nesse encontro é o amor, enquanto sentimento e ação de ver e acolher o outro na convivência. A segurança legítima vem da vida compartilhada, uns com os outros, em total cooperação.
O XXVI Congresso Brasileiro de Análise Transacional vai dialogar, refletir e desenvolver ações que nos permitam sair desse ciclo medo/esperança/medo para um movimento de contato/presença/ação amorosa, em direção ao mundo que desejamos.
Serviço:
XXVI Congresso Brasileiro de Análise Transacional – Esperança e Medo: O que te Move?
De 31 de agosto a 2 de setembro, com seminários e mesas que contarão com as presenças de mais de 40 profissionais da área, entre eles a analista inglesa Julie Hay
Na Casa de Retiro Vila Betânia (Rua da Gruta, 230, bairro Glória, em Porto Alegre).Inscrições abertas no site unat.org.br.