Em uma sexta-feira, a musa fitness Gabriela Pugliesi posta para seus 2,7 milhões seguidores no Instagram um vídeo pedalando. Na legenda, a hashtag #incentivepessoas.
Naquela mesma manhã, os 31,8 mil usuários que seguem o perfil @papodevestibulanda, administrada por duas estudantes de Dom Feliciano, no interior do Rio Grande do Sul, recebem no feed um resumo sobre as principais datas da Revolução Farroupilha.
Pugliesi posta bastidores dos seus exercícios de abdômen. As gaúchas, dos exercícios de história.
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Esse é mais um nicho de instagrammers e youtubers que ganham a cada dia centenas de seguidores fiéis. As gaúchas vão atrás de macetes para facilitar a memorização de fórmulas, memes engraçados sobre a vida de vestibulando e frases motivacionais.
– Eu tinha aula sempre à tarde, então estudava direto de manhã e à noite. Comecei a postar meus resumos e de tudo um pouco. Começou de maneira bem relax. Quando se estuda para o vestibular, tudo gira em torno disso, então essa foi uma forma de aliviar um pouco a rotina e ajudar outras pessoas – conta Karoline Kuczynsky, 21 anos.
– A motivação que passo para os seguidores, eles me passam em dobro. Foi uma das bases para eu continuar estudando. Às vezes, estava perdendo o foco e pensava: "Não, tenho de fazer o resumo, o pessoal do Instagram está esperando" – acrescenta Gabrielle Azambuja, também de 21 anos.
Enquanto Gabriela Pugliesi lucra com a imagem e com o seu nome estampado em produtos, as meninas preferiram ficar anônimas – pelo menos até o final de julho, quando Gabrielle foi aprovada em Medicina na Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc). Karoline estuda para ser médica na Universidade Católica de Pelotas (UCPel) desde o começo do ano, mas ainda almeja vaga em uma universidade federal.
Elas decidiram não revelar suas identidades até que vissem seus nomes no listão. Entre os motivos, estão a timidez e a incerteza de como os colegas de cursinho reagiriam.
– Agora que essa vida de cursinho acabou, vamos postar nosso rosto quando atingirmos os 35 mil seguidores – revela Gabrielle.
Em uma cruzada pelos perfis de concurseiros, universitários e vestibulandos, é comum encontrar criadores que zelam pelo anonimato.
– Vou colocar mesmo o meu nome e tudo quando eu passar. Com certeza, o pessoal poderia comentar: "Ah, por que ela sabe o conteúdo tem a obrigação de passar" – comenta a alegretense Gabrielli Rodrigues de Medeiros, 18 anos, do perfil @gabinamed (10,6 mil seguidores no Instagram), que também tenta uma vaga em Medicina.
Mesmo objetivo da pernambucana Leylanne Naubarth, 21 anos, do perfil @projetomedicadiva, seguido por 69 mil pessoas no Instagram. Também em seu site pessoal, no canal no YouTube e na página no Facebook, ela intercala os macetes das provas com detalhes do dia a dia.
– Quando você estuda sozinha e não tem ninguém para cobrar, a ideia de ter de postar uma foto estudando todos os dias gera essa obrigação. O Instagram me cobra indiretamente – explica.
Planejamento personalizado
A potiguar Rosângela Rangel, 34 anos, é a cabeça por trás do perfil @ritmodeconcurseira, um dos mais conhecidos desse nicho. Com cerca de 93 mil seguidores, a servidora pública do Rio de Janeiro começou o perfil em 2013, mas desde 2008 estuda com foco em empregos públicos. Já aprovada, ela continua o esforço, pois almeja outro cargo, o de analista no Tribunal Regional Federal (TRF).
Rosângela ajuda outros concurseiros a organizarem suas rotinas, com dicas de materiais e planos de estudo. Também produz os chamados "planners", agendas de planejamento das disciplinas a serem revisadas – conteúdo que disponibiliza online gratuitamente. São feitos de acordo com as necessidades de cada candidato. Alguns ganham personalização, com desenhos e estampas que ela mesma faz – mas esses são cobrados.
Desde que começou a somar seguidores, ela passou a ser procurada por marcas: editoras de livros, papelarias e cursos online.
– Recebo livros caríssimos, coleções inteiras, mas evito postar qualquer coisa só por postar. Não é só a blogueira de maquiagem que posta sobre um batom e todo mundo compra, acontece isso também com livros. Por isso, tenho o cuidado de ver se a didática é boa – resume.
A servidora pública conta que faz parcerias, mas revela que não tem patrocínios fixos nem é paga para indicar produtos. Ela ganha, por exemplo, vale-presentes para fazer cursos preparatórios, em valores que chegaram a R$ 3 mil.
Nos comentários, as seguidoras – grande parte mulheres – agradecem, comentam, fazem perguntas: "Que cor é esse teu esmalte?", "Estou entrando neste mundo de concurso e quero me organizar... Me ajude", "Onde você comprou essa caneca? Estou doida atrás de uma!" ou "Tô amando processo civil, coisa louca!".
– Ninguém vive só de estudar, então posto outras coisas da minha rotina, mas tenho cuidado. Antes de viajar, perguntei se poderia postar fotos na Disney. Imagina a pessoa se matando a estudar e eu postando fotos fora do país? Mas elas responderam que dá ânimo, que depois que passarem, poderão viajar também – diz.
Ela já foi reconhecida no corredor da papelaria de um supermercado. Mas também lida com os "haters" – como chama os críticos –, e resolveu mostrar fotos do próprio rosto depois que muitos começaram a perguntar quem ela era.