Abel Braga não tem apenas uma receita para ter deixado o Inter na situação que está, líder e considerado favorito para ser campeão brasileiro faltando seis jogos para encerrar a competição. Há, porém, um ingrediente bem nítido em suas declarações. Não ousem usar o termo "favoritismo" perto do treinador. Por certo ele não gostará, passará uma descompostura em quem falar, mas, tempo depois, irá concordar, como já fez anos atrás.
Em 2008, Abel era técnico colorado durante o Gauchão. A campanha foi de alto nível, e a escalação, com figuras como Fernandão, Alex, Iarley, Clêmer, Índio, todos remanescentes do título mundial de dois anos antes, recebeu ainda Nilmar e Guiñazu e Magrão como novidades.
Houve encantamento ao longo da competição. As vitórias, a movimentação intensa e especialmente a quantidade de gols eram saudadas por todos. Era bonito ver a equipe jogar. Para se ter uma ideia, na final do campeonato, o Inter goleou o Juventude por 8 a 1 no Beira-Rio.
Tal qualidade gerou o apelido de "Carrossel" à equipe. Bastava alguém fazer alusão a isto e Abelão ficava irado, acusando que falasse de estar mobilizando os adversários e semeando a soberba em seus jogadores. O treinador simplesmente não admitia que tinha em mãos um grupo de desempenho formidável.
Passados dois anos, em 2010, visitado em Abu Dhabi quando treinava o Al Jazira, Abel Braga conversava descontraído e sorridente lembrando suas passagens no Beira-Rio. Ao ser provocado com a pergunta "E o time de 2008? Lembra que foi chamado de Carrossel?". O técnico deu um pulo na cadeira, abriu um sorriso e falou emocionado:
— Cara, aquele time era lindo de se ver jogar. Eu me orgulho daquele Gauchão. Nós beirávamos a perfeição. Era realmente um carrossel.
Veio a interrupção:
— Mas você ficava bravo quando se dizia isto ...
A tréplica estava na ponta da língua:
— Eu não podia admitir. Tinha que manter meu grupo focado e não podia dar arma para os inimigos. Mas eu concordava com tudo que vocês (jornalistas) diziam.
Passada uma década, a experiência do treinador está o fazendo repetir a receita. Por mais que as entrevistas mostrem uma estratégica e necessária dose de humildade, ele sabe que nunca o Brasileirão esteve tão à feição para os colorados. Pode saber que Abelão, no fundo, saiba que é favorito, mas não se permite dizer. É hora de evitar, quem sabe proibir, elogios.