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Escrevi recentemente neste espaço que Estados Unidos e Brasil preparam para novembro um grande exercício de seus exércitos na Amazônia. A iniciativa, a contragosto de setores mais nacionalistas no Exército, é um indício de reaproximação após mais de uma década de esfriamento das relações entre os dois países – e de desinteresse estratégico americano pela América Latina.
No contexto de nova velha Guerra Fria atual, com antigos antagonismos ressuscitados entre Rússia e EUA, um movimento de alinhamento do Brasil com Washington não passa despercebido. As diplomacias se movem, e a reação não tardou.
Em uma manobra sutil, a Rússia tenta atrair o Brasil para sua área de influência. O aspecto mais visível dessa iniciativa é o fato de o país ter sido mencionado como possível integrante de uma força de paz na Síria, país do ditador Bashar al-Assad há seis anos anos em guerra civil .
A ideia, que conta com apoio dos governos turco e iraniano, seria criar uma zona de exclusão aérea sobre a Síria e quatro áreas desmilitarizadas em solo para facilitar o refúgio da população civil e possibilitar um corredor humanitário para o ingresso de comida e medicamentos.
A opção surge no momento em que o Brasil está prestes a sair do Haiti, após 13 anos de missão da ONU, a Minustah. O presidente Michel Temer tem interesse em manter operações de paz no Exterior, algo que agrada às Forças Armadas. Missões como a do Caribe e em outros oito pontos do planeta onde o Brasil tem militares – a maioria pequenos efetivos, como observadores – ajudam a manter a tropa azeitada, em movimento.
No cenário internacional, conta pontos a favor do Brasil a “neutralidade” em relação aos diferentes atores do Oriente Médio. Em outras palavras, o fato de não tomar partido para qualquer um dos lados. O governo Al-Assad, por exemplo, não aceitaria uma força da ONU integrada por militares turcos ou oriundos de países europeus. A oposição síria, mais reticente em relação ao plano de fatiamento do terreno, rejeita exércitos russos e iranianos.
Depois do Haiti, o Ministério da Defesa brasileiro cogitava participações em operações da ONU no Líbano ou no Mali. Líbano seria a opção mais fácil. A Marinha brasileira mantém lá uma fragata no comando de uma força naval da ONU que tenta garantir a inviolabilidade das águas territoriais do país, após cessar-fogo com Israel. O Mali, país africano em guerra civil e com presença de grupos terroristas aliados à rede Al-Qaeda, seria o pior dos mundos.
Na Síria, o Brasil enfrentaria dificuldades operacionais diferentes das encontradas no Haiti – ações no deserto e diferentes tipos de atores, um cenário bem mais complexo do que no Caribe.
– O problema é que não temos equipamentos para essas operações. E não seria o passeio que foi no Haiti – avalia o especialista em assuntos militares e editor do site Defesanet.com.br, Nelson Düring.