Há quem imagine que as disputas políticas no Brasil possam ser descritas como um confronto entre "direita" e "esquerda". Sinto dizê-lo, mas essa é uma forma de viajar na maionese. Posições à direita e à esquerda existem e podem ser localizadas - com certa dificuldade, é verdade - em muitos temas. O emprego das expressões, sobretudo após o fim da guerra fria, serve basicamente para demarcar posições mais pró-mercado ou mais pró-regulação, as primeiras tendencialmente mais liberais em termos econômicos, as últimas alegadamente mais focadas na redução das desigualdades sociais. Digo "tendencialmente" e "alegadamente" porque os liberais no Brasil adoram falar em "Estado mínimo", mas apreciam ainda mais o BNDES e o Carf, e porque a esquerda, uma vez no poder, descreve as chamadas conquistas sociais em termos épicos quando, na verdade, não foi capaz de criar sequer um arremedo de Estado de Bem-Estar.
Os dois blocos políticos que polarizam as disputas eleitorais no Brasil há mais de 20 anos, PT e PSDB à frente, diferenciam-se por suas origens e pressupostos ideológicos, mas se assemelham muito em suas políticas e condutas. São, na verdade, irmãos siameses, unidos pelo mesmo tronco da política tradicional. No corpo que dividem estão o patrimonialismo, a corrupção, o cinismo, o atraso cultural e o desprezo pela República. As opções tradicionais à esquerda e à direita no Brasil são sabidamente incompetentes para reformar o Estado e reproduzem com a mesma covardia a mais forte de todas as leis não escritas da gestão pública no Brasil: os ricos não podem perder. É impressionante que o Tesouro Nacional tenha repassado ao BNDES R$ 123,1 bilhões entre 2008 e 2015 para que o banco efetuasse operações de crédito para o setor privado com juros subsidiados, em taxas muito inferiores àquelas praticadas no mercado. O saldo dessa festa estava em R$ 523,86 bilhões ao final de 2015, quase 9% do Produto Interno Bruto. O "bolsa empresário", batizado de Programa de Sustentação do Investimento (PSI), pretende seguir ajudando empreiteiras e outras grandes empresas até 2060. Os intermediários das operações de crédito são os bancos privados, claro, que adoram a sensibilidade do governo. PT e PSDB estão juntinhos nessa também. Aliás, não há no Brasil qualquer escândalo em torno dessa transferência maciça de renda da população para o andar de cima. Em um quadro do tipo, conversa sobre "direita" e "esquerda" serve para que os bois sigam dormindo.
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zhora.co/MarcosRolim