Há sérias dúvidas de que o projeto que limita a cobrança de ICMS sobre combustíveis e energia elétrica aprovado na quarta-feira (25) pela Câmara dos Deputados passe no Senado.
Nesta quinta-feira (26), o presidente da chamada "casa revisora", Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que não há prazo previsto para a apreciação. Se e quando passar, pode criar uma situação inusitada: quem não tem carro vai bancar o combustível dos que têm.
Como assim? Depois das queixas de governadores e prefeitos sobre o impacto na arrecadação, estimado em R$ 70 bilhões para todos os Estados e municípios, uma gambiarra foi montada para reduzir resistências. Perdas acima de 5% da arrecadação seriam compensadas por uma espécie de desconto nos pagamentos das dívidas dos Estados com a União.
Como uma das funções do Senado é exatamente representar os interesses dos Estados, haverá uma longa batalha até uma eventual apreciação. Dado o calendário, é provável que invada o período eleitoral, com um terço dos parlamentares mais interessados em garantir a reeleição.
Caso tudo dê certo — há dúvida, por exemplo, se a redução do ICMS seria de fato repassada aos consumidores nas bombas —, o mecanismo reduziria a arrecadação da União, que teria de buscar alguma compensação para o não pagamento de parcelas da dívida dos Estados. E o que isso significa? Quem bancaria a diferença, como sempre, seriam os contribuintes. Nesse caso, mesmo os que não têm carro ajudariam a bancar uma esperada, mas não garantida, redução no preço dos combustíveis.
Nem o governo Bolsonaro nem a Câmara dos Deputados apresentaram estimativas sobre o efeito no preço final dos combustíveis com a medida. Nos cálculos que já circulam, o efeito no Rio de Janeiro, que tem alíquota de 34%, seria de R$ 1,15 por litro de gasolina. Em São Paulo, com incidência de 25% — a mesma cobrada no Rio Grande do Sul —, seria de escassos R$ 0,48.
Para deixar claro, o grande impacto da medida é sobre a gasolina, porque estabelece teto para a alíquota de ICMS entre 17% e 18%. As que incidem sobre o diesel costumam ser mais baixas. No Estado, por exemplo, é de 12%.
"Vantagem" para o RS?
A proposta aprovada na Câmara é "menos ruim" para o Rio Grande do Sul: como o Estado está prestes a aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RFF), não precisaria esperar as perdas acumularem 5%, teria possibilidade de reter pagamento da dívida ante qualquer percentual de redução.
Parece "menos ruim", mas não é, porque neste momento o Piratini não paga nada da dívida graças a uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF). A medida deve cair assim que o RRF for formalizado, mas ainda assim não é vantajoso.
Atualização: no final da manhã, depois da publicação desta nota, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que "não tem cabimento" compensar Estados e municípios por eventuais perdas com a redução de alíquota de ICMS sobre combustíveis e energia elétrica. Comparou a iniciativa à criação de "um subsídio federal para o governo pagar em cima dos combustíveis". E adiantou, ainda, que "se passar no Senado" (nem ele acredita?), vai consultar o Ministério da Economia sobre a possibilidade de vetar a emenda. Spoiler: os técnicos vão dizer que, nesse caso, a medida é inconstitucional, porque retira receita de outra esfera de poder.
A política de preços da Petrobras
Para reajustar o preço nas refinarias, a Petrobras adota um cálculo chamado Paridade de Preços de Importação (PPI), adotado em 2016, no governo Temer. A intenção é evitar que a estatal acumule prejuízo com por não repassar aumentos de produtos que compra do Exterior, tanto petróleo cru quanto derivados, como a gasolina. A fórmula inclui quatro elementos: variação internacional do barril do petróleo — com base no tipo brent, que tem preço definido na bolsa de Londres —, cotação do dólar em reais, custos de transporte e uma margem definida pela companhia, que funciona como um seguro contra perdas.