O jornalista Carlos Redel colabora com a colunista Juliana Bublitz, titular deste espaço.

Um dos maiores nomes da música brasileira, Milton Nascimento, o Bituca, realizou a sua turnê de despedida dos palcos em 2022. E todo este processo — e muito mais — foi acompanhado de perto pela cineasta gaúcha Flavia Moraes (Acquária, Visions in the Dark). Ela ficou ao lado do artista durante dois anos para a realização do documentário Milton Bituca Nascimento, que chega aos cinemas nacionais no próximo dia 20.
— Acompanhar o Bituca foi um privilégio. Poder dividir sua intimidade, muito mais. Vivi ao seu lado momentos inacreditáveis. Ele é um artista gigante, difícil de explicar. Aliás, o filme trata disso: é uma personalidade curiosa, complexo e simples ao mesmo tempo. Ele foi muito generoso comigo — destaca a diretora porto-alegrense em entrevista para a coluna.
O projeto chegou até Flavia por meio do filho e empresário de Bituca, Augusto Nascimento, e por Victor Pozas, diretor musical do documentário, com que a gaúcha já havia trabalhado antes. Ela acredita que o seu carreira bem desenvolvida tanto nos Estados Unidos quanto na Europa ajudaram na escolha — afinal, o filme também percorre estes locais.
— No início, sofria muito com a minha própria expectativa e uma ansiedade criativa enorme, mas, à medida que íamos produzindo, entendi que Milton é um predestinado e que, por mais caótico que o processo pareça, tudo acaba se encaixando harmoniosamente. É como se o documentário já estivesse pronto antes mesmo de eu fazer. Nós só precisávamos criar o espaço necessário para que o filme se manifestasse — afirma Flavia.
Durante a produção, Flavia e sua equipe estiveram com alguns dos maiores artistas do mundo, que gravaram depoimentos sobre Milton. Entre os nomes ouvidos para o documentário, estão Pat Metheny, Quincy Jones, Herbie Hancock, Esperanza Spalding, Fito Páez, Sérgio Mendes, Caetano Veloso, Chico Buarque, Djavan, Gilberto Gil, Mano Brown, entre muitos outros. Um elenco à altura de Bituca.
Flavia explica que o documentário, um road movie, convida o público a pegar a estrada com o seu grande personagem principal e, nesta jornada, muitas surpresas ocorreram. E alguns entrevistados "caíram do céu", com Milton os convidando para os shows, Augusto organizando as entrevistas e a equipe de Flavia gravando tudo.
Inacreditavelmente, me vi na situação de dizer a seguinte frase: pede para o Spike Lee esperar 10 minutos, estou acabando a entrevista com o Paul Simon
FLAVIA MORAES
Diretora do documentário "Milton Bituca Nascimento"
— Pode parecer fácil, mas era justamente o contrário. Nem sempre sabíamos com quem iríamos conversar. Filmar Milton Bituca Nascimento foi como ouvir sua música: você sente primeiro, entende depois. E eram múltiplas unidades de câmera, com um set pronto para entrevistas no backstage, uma câmera sempre com o Milton e outra fazendo coberturas. Tudo take único. Inacreditavelmente, me vi na situação de dizer a seguinte frase: "Pede para o Spike Lee esperar 10 minutos, estou acabando a entrevista com o Paul Simon".
A produção do filme, segundo Flavia, começou pequena, com uma única câmera e uma equipe de três pessoas. O filme, com o passar dos meses, foi crescendo, ganhando apoios, e, no último show da turnê, em Minas Gerais, havia até helicóptero e uma associação com a TV Globo para a captação das imagens — com 12 câmeras, drones e tudo o mais o que se tem direito.
No total, foram mais de 100 horas de material captado. E, para Flavia, o resultado foi um trabalho de exclusão, com muitas filmagens ficando de fora — inclusive, entrevistas inteiras com o próprio Bituca. Mas foi possível demonstrar a grandeza do protagonista que, segundo a diretora, se emocionou com o filme.
— Pouca gente tem noção do tamanho que o Bituca tem lá fora. Ele visto de fora é gigante. É como o Brasil: é maior do que visto de dentro. Ele é um talento fora do comum, é o Brasil profundo. Uma criança, um cara complexo, um cara simples e muito generoso. Foi uma viagem e eu estou contente de poder, agora, mostrar esse filme para as pessoas — finaliza Flavia.
Voltando às suas origens, a cineasta, que vive nos Estados Unidos, apresenta, em Porto Alegre, uma sessão de pré-estreia para convidados de Milton Bituca Nascimento no dia 19, na Cinemateca Capitólio, a partir das 19h30min.