Já imaginou Pirisca Grecco cantando bossa nova? Pois a voz dele, exemplar na jobiniana Wave, abre o ótimo quinto álbum do contrabaixista e compositor Ghadyego Carraro, Tribute — lançamento dia 18 nas plataformas digitais e brevemente também em CD. Pelo trabalho que realiza, o passo-fundense Ghadyego já merecia ser bem mais conhecido no Rio Grande. Tribute é o que diz o título, uma série de homenagens de fino bom gosto a compositores que ele admira. Com uma afinação que o deixa especialmente “cantante”, o baixo está no primeiro plano quase sempre. Em Wave e Lamento Sertanejo (Dominguinhos/Gilberto Gil), esta cantada lindamente por Anaadi, é só baixo e voz. São as únicas com letra.
Pelas sete faixas desfilam instrumentistas de diferentes órbitas, gravando suas participações em casa, a partir dos arranjos e bases de baixo enviados por Ghadyego. A norte-americana Lauren Conklin, que toca violino em Oblivion (Piazzolla), ele conheceu pela internet. Rogério Pitomba, convidado a juntar sua bateria ao piano do osoriense Cristian Sperandir em Vera Cruz (Milton Nascimento/Marcio Borges), é brasileiro mas mora em Lisboa. Em Sonora (do baixista Arthur Maia, precocemente falecido em 2018), estão Di Stefano, baterista que tocou com meio mundo e vive em Brasília, e o saxofonista Joaquin de La Montagna, da primeira linha do jazz espanhol. Ghadyego foi se enturmando com esse pessoal ao longo do tempo e das trocas de impressões.
Dois velhos amigos da adolescência musical em Passo Fundo marcam presença: o baixista Ronaldo Saggiorato é o autor de O Peixe, com presença da impressionante gaita de boca de José Staneck, paulista radicado no Rio, mais vinculado à música de concerto; e o violonista Alegre Corrêa, autor de Encontro das Águas, em cujo arranjo também está outro jovem músico gaúcho da turma de Sperandir, o baterista Sandro Bonato. Resumindo: um trabalho imperdível. Mas o espaço chega ao fim e ainda não foi dito que Ghadyego Carraro, 40 anos, é também professor, doutor em música pela Universidade de Passo Fundo, estudou na Itália e se apresenta regularmente na Europa com alguns dos músicos citados.
Seu plano de viver no Exterior (Itália, Espanha ou Estados Unidos) foi brecado temporariamente pela pandemia. Assim que ela passar...
Vem aí o centenário de Luiz Menezes
O lançamento de uma nova gravação do clássico Piazito Carreteiro, por Renato Fagundes, deu a largada, esta semana, ao projeto Cantando Luiz Menezes. Até maio de 2021, quando se iniciarão as comemorações pelo centenário de nascimento do poeta e compositor, outras músicas serão disponibilizadas nas plataformas digitais. Nascido em Quaraí, Luiz Menezes (1922/2005) é nome de ponta da cultura regional gaúcha. Além de músico, apresentou programas de rádio como o famoso Grande Rodeio Coringa, líder de audiência das noites de domingo da Farroupilha.
Em seu repertório destacam-se Cantiga do Bem Querer, Última Lembrança e Milonga do Contrabando, primeira milonga com letra em português, de 1954. Menezes lançou cinco discos e quatro livros de poemas gauchescos. Já Renato Fagundes é filho de Dorotéo Fagundes, conhecido nome do nativismo. O novo arranjo de Piazito Carreteiro é dele e Antônio Flores, que também toca violão e guitarra na gravação, com Renato Muller na gaita ponto, Texo Cabral na flauta, Miguel Tejera no baixo e Bruno Coelho na percussão. A musicista Izabel L’Aryan coordena o projeto.
Antena
ARTE DO POVO, de Mingo Silva
Difícil entender como este sambista de Niterói, RJ, lança, aos 50 anos, o primeiro disco, e não foi ouvido direito antes. Porque, simplesmente, ele é tão bom quanto João Nogueira e Zeca Pagodinho — e essas comparações não são gratuitas, ouça o disco e me conteste. Conforme Moacyr Luz, seu coordenador, tem 10 anos que Mingo Silva começou a participar do projeto Samba do Trabalhador, inicialmente mais como percussionista. E só agora o álbum, saudado pelo próprio Luz como tendo “a maturidade de um mestre”. São 14 músicas dele e parceiros, com temas típicos do gênero, desilusão amorosa, o cotidiano do povo, a exaltação mística ao samba. Além de compositor definido, Mingo canta com personalidade. Moacyr Luz e Pagodinho fazem participações especiais. Biscoito Fino, R$ 32,90
DE LUA - CANÇÕES DE LUIZ GONZAGA, de Nino Karvan & Alberto Silveira
Antes de ouvir, você imagina: um disco de baião, xote e xaxado, com muita sanfona e zabumba e os sucessos do Gonzagão. Errado. Este é um trabalho de voz e violão em clima quase minimal, com ênfase nas melodias e letras, não nos ritmos. Acertaram o cantor Nino Karvan e o violonista (cordas de aço) Alberto Silveira, ambos sergipanos de largo currículo, na visita à obra do mestre da música nordestina. Em texto emocionado, Chico César escreve no encarte que “reinventar Gonzaga é reinventar o Brasil como um lugar de todos” e que este disco “é um sereno ato político”. Algumas das músicas, com vários parceiros: Légua Tirana, Pau de Arara, Assum Preto, Juazeiro, Riacho do Navio. Nos arranjos, Alberto se dá a liberdade de citações de Bach e Villa-Lobos. Kuarup Música, R$ 25