Sei que pode soar meio pedante, mas o fato é que já palestrei para vários milionários brasileiros – e alguns bi também. Como eles não costumam perder tempo nem dinheiro, suponho que tenham gostado, pois repetiram a experiência. Uma dessas ocasiões se deu às margens do lago Nahuel Huapi, em Bariloche, nos contrafortes dos Andes, num dos mais lendários hotéis do continente e cujo nome em língua indígena apropriadamente significa Rico-Rico, Doce-Doce. Pois lá, ao lado da lareira onde toras de cipreste da Patagônia ardiam, crepitantes e perfumosas (vindas de árvores já tombadas) éramos três palestrantes. Graças aos céus, fui escalado para abrir os trabalhos: não sei se conseguiria abrir a boca depois dos outros dois.
Com o habitual brilhantismo – superado só pela modéstia e por um ou outro exagero –, coube a mim discorrer sobre o cabo de guerra que, ao longo de três turbulentos séculos, forjou as fronteiras do Cone Sul. Após 50 minutos de lero-lero no Llao Llao, tive minha dose aplausos – protocolares. Aí, passei a bola para Steven Dubner, na época chefe da equipe paralímpica brasileira. Ele apanhou o microfone e disse: “E aí, bando de aleijados?” Foi uma das melhores palestras que assisti na vida – e olha que já fiz esse circuito todo. Dubner põe em prática o lema daquela multinacional de artigos esportivos: “Impossible is nothing”.
E impossível parecia também que alguém pudesse suplantá-lo. Mas o fato é que o melhor estava por vir. Não vou declinar o nome do último palestrante; basta anunciar-lhe o cargo: era o chefe do programa de colonização do espaço da Nasa. Sim, isso aí. Só isso. Eu já tinha descoberto que o cachê dele fora dez vezes superior ao meu. Que absurdo! Deveria ter sido cem vezes mais. O sujeito parecia um daqueles mágicos de Las Vegas: tinha cabelos platinados, botox na testa, olhos faiscantes, sapatos lustrosos, uma gravata lilás. Mas era... chefe do projeto de colonização do espaço da Nasa. E por uma hora deixou uma penca de milionários – e um pobretão – boquiabertos.
Era 2001 e aqueles reunidos ali, à franja dos Andes, ficaram sabendo daquilo que, com 20 anos de atraso, revelo para você: sim, os humanos vão colonizar o espaço. Marte é vítima ideal, a bola da vez, no atacado e no varejo. Duas décadas após os coelhos que o homem platinado tirou de seu lap top, tudo segue à risca o script dele. Mas o roteiro não foi escrito só pela Nasa. A ficção de H.G. Wells e Edgar Rice Burroughs já havia me deixado íntimo dos marcianos. Por isso, tremo ao perceber que tudo que escutei naquele dia é cada vez mais real. Pois em Crônicas Marcianas, Ray Bradbury descreve o Planeta Vermelho depois que os humanos chegaram lá. Nos mares de areia morta, o vento sopra uma poeira rubra; uma lata vazia de Coca-Cola rola lentamente.