Eureca, gritei da banheira, assombrando minha mulher. “O que foi?”, indagou ela, simulando interesse. “Achei a saída”. Ela disfarçou o bocejo e tornou a reclinar-se no divã. Imaginou que estaria diante do anúncio de mais uma das minhas mirabolantes soluções para o Brasil. Mas dessa vez ela se equivocou. Não na suposição de que eu iria apontar a saída. Mas ao intuir que ela seria delirante. Não, não: dessa vez eu matei a charada.
Proponho um divórcio amigável. Uma transição branda – porém definitiva. Uma separação, uma ruptura, uma secessão. Mas consensual, na santa paz. Claro que será preciso abrir mão de bom patrimônio. Mas é o preço a pagar por um pouco de paz.
Eis meu plano: como #somos 70%, #estamos juntos e demos #Basta, proponho a criação de um novo pais . Chamar-se-á Brazilândia e vai ocupar os atuais estados do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Tocantins, Goiás e Rondônia. Uma partilha generosa, pois isso equivale a mais de 30% do território nacional – e será cedido a apenas 30% dos (ex)brasileiros e futuros brazilianos. (Sim, já sinto falta daquele vastos pastos, do gordo gado, da soja transgênica balouçando ao vento seco, mas vamos em frente).
Não pretendo morar lá, mas antevejo o paraíso. Lá, a Terra, criada em sete dias, será indiscutivelmente plana. Lá, todos serão pastores – se não evangélicos, de bois. Lá, todos serão a favor do verde – e do amarelo. Tanto é que só andarão enrolados na bandeira de seu ex-país (cedida a eles). Lá, não haverá índios nem ciganos e os negros acharão que a escravidão não foi tão ruim assim. Lá, ninguém usará máscaras, a não ser à luz de tochas. Lá, todos andarão armados. Lá, não haverá ministro da Saúde, mas cloroquina para todos. Lá, a música será sertaneja – sem meia-entrada. Lá, os madeireiros não deixarão pau em pé, só de pinus. Lá, o desmatamento, os garimpos e os agrotóxicos estarão liberados: a boiada vai passar. Lá, não teremos veados, só vacas. Lá, todos se comunicarão pelas redes sociais e acreditarão em fake news. Lá, não haverá imprensa livre – presa talvez. Lá, aberta, só a TV, com novela bíblica. Lá, não haverá doutrinação, nem teatro nem cinema: todos investirão no culto. Lá, o governo civil será exercido por miliares. Lá, não teremos os vagabundos do Judiciário e a velha política será nova. Lá, torturadores serão heróis e os milicianos premiados. Lá, os meninos vestiriam azul e as meninas rosa, se não estivessem de verde e amarelo. Lá, não haverá arco íris para não dar bandeira. Lá, o nazismo será de esquerda e o fascismo será o que sempre foi.
Lá, haverá eleições, mas não serão necessárias. O povo de Brazilândia já encontrou seu Messias.